Meninos, eu vi

Pela manhã, a caminho do sagrado compromisso do meu cafezinho matinal, chego ao fim da minha rua.

Como sempre faço, escaneio a paisagem para ver o que está nos esperando.

Nada pela direita, à frente dois carros se preparam para a conversão à esquerda, uma motinho se aproxima por esse lado. 

O primeiro carro avança, porque a motinho ainda está longe, mas certamente não daria tempo de o segundo carro avançar.

Para minha surpresa, o segundo carro avança bem na frente da motinho, e para conseguir parar a moto o piloto teve de frear tudo que podia e xingar tudo que não podia.

Trocam gestos irreproduzíveis em russo, seguidos por este que vos tecla, e cada um segue seu caminho.

O meu era na mesma direção e, coincidentemente, emparelhado na contramão ao lado do carro.

— Não viu a moto?

— Ele estava com a sinaleira ligada!

Hummm.... fato.

A gente fica revoltado de ver um motociclista sendo fechado e se solidariza com ele, porque não gostaríamos de estar na mesma situação, e a adrenalina ferve no sangue.

Mas o fato é que o cara da motinho se esqueceu mesmo de desligar a seta e seguiu em frente.

O motorista viu a seta ligada, interpretou que a moto ia entrar ali na nossa rua e cortou a frente dele.

Quem errou?

Os dois.

O motociclista errou porque não desligou a seta, e o motorista errou porque acreditou em uma seta ligada.

Sempre recomendo nunca acreditar em uma sinaleira ligada porque qualquer esquecimento pode causar acidentes do tipo que este quase foi.

Para os motociclistas, esquecer a seta ligada é muito provável e perigoso, devido à nossa fragilidade no trânsito.

Motoristas possuem seta de desligamento automático, e estão tão acostumados com isso, que nem sequer imaginam que as motos não possuam esse recurso, então desconhecem a enorme chance de os pilotos esquecerem a sinaleira ligada.

Então os motoristas nunca darão a chance da dúvida de que sua seta ligada possa ser fruto de esquecimento.

Ao ver sua seta ligada, eles entrarão na sua frente de modo automático e só perceberão o engano quando você já estiver polindo o capô do carro.

Então nunca se esqueça de desligar sua seta, treine para nunca esquecer de desligar sua seta, seja meio totalmente paranoico como eu, que vivo desligando a seta mesmo quando ela não está ligada.

Um pouquinho dessa paranoia poupa grandes dores de cabeça.

Puxa, mas será que não existe uma maneira de eliminar a chance de esquecer a seta ligada?

Sim, existe esta aqui:

É uma adaptação fácil de fazer, e tem muita gente fazendo, mas tem um porém que falo mais abaixo.

Também teria esta outra:

Reportagem: http://www.motonline.com.br/noticia/brasileiros-criam-sistema-inteligente-de-seta-para-motocicletas/

Foi tema de reportagem/divulgação no motonline, você vê neste link aqui.

Qual o problema com esses sistemas? 

Porque você não vê ninguém usando?

O problema número 1 é que a legislação é burra e engessada e não permite que você faça modificações no sistema elétrico da moto.

Uma adaptação benéfica como essa campainha ou esse dispositivo de desligamento automático podem dar apreensão da moto para o pátio, porque modificações como essas teriam de ser originais de fábrica. E aí não seria modificação...

Em um país onde você toma multa por trafegar com o farol alto aceso em rua que tem iluminação pública durante o dia, esperar o quê das otoridades interessadas apenas em multar e arrecadar? 

E sabe quando que as fábricas gastarão um centavo a mais com esse tipo de equipamento de segurança?

Nunca. Uma carenagem com adesivo estiloso enche os olhos e aumenta as vendas, um pisca que faz plim plim não.

Segurança custa caro (hahahaha — na visão deles, né?) e clientes se estourando nos cruzamentos da vida não são problema das montadoras.

Saiu da porta da concessionária, meu caro, minha cara, o problema é todo seu.

Se o governo não fizer uma lei obrigando, nunca que você verá esses sistemas em prática.

Mas você sabe como o governo não está nem aí com nada, né?

Os inventores brasileiros do dispositivo automático são bem intencionados, mas ingênuos.

Estão esperando que as montadoras entrem em contato para negociar a patente...

Não sabem que esses dispositivos já equipam motos de luxo de grandes cilindradas há décadas.

Simplesmente não há interesse das montadoras em popularizar um recurso que evitaria muitos acidentes.

Ele diminuiria a margem de lucro sobre cada moto e diminuiria as vendas de peças de reposição bem caras.

Um abraço,

Jeff