quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Dar tranco na moto estraga o motor de partida? Como funciona a partida elétrica das motos?

Transcrevo a dúvida do leitor gbs na postagem Como fazer a moto funcionar no tranco: 

Minha moto pifou o motor de partida, o mecânico não recomendou o tranco dizendo que era arriscado, porque 'não sei o que' é em X, é uma Virago. 

Ele disse que a escovinha foi 'detonada' pelos poucos trancos que tive que dar. 

Isso procede? 

Alguma dica para instalação caseira de um motor de partida novo?

Bom, vamos lá:

Primeiro, vamos entender de maneira resumida como funciona o motor de partida dos carros:

Quando você aciona o interruptor de ignição, o relé de partida envia corrente para energizar o motor de partida para que ele gire.

Simultaneamente, o bêndix (um atuador com bobina eletromagnética e mola de retorno) empurra uma alavanca que desloca o pinhão para fora do alojamento e ele se engrena com a enorme coroa do volante do motor, fazendo girar o virabrequim.

Quando o interruptor de ignição retorna para a posição normal de funcionamento, o motor de partida para de girar e o atuador se recolhe automaticamente porque, se continuasse engrenado, a rotação do motor faria o motor de partida girar arrastado e suas escovinhas de carvão seriam detonadas. 

Ah, então o que o mecânico falou era verdade?


Até onde eu sei, não.

O sistema de partida da moto funciona de um jeito diferente — ele não tem bêndix.

O pinhão permanece acoplado com a engrenagem louca de partida o tempo todo.

Então como é que as escovinhas não são detonadas?

Porque a engrenagem louca de partida é acoplada a um dispositivo tipo catraca, também chamada de embreagem unidirecional.

Por que ela é chamada de louca?

Porque ela só gira quando está sendo acionada pelo motor de partida.

A embreagem unidirecional é de um desses dois tipos aqui embaixo:

E como o nome diz, ela só permite o giro em uma direção.

Quando você aciona o motor de partida da moto, o pinhão de partida faz girar uma série de engrenagens até chegar à engrenagem louca de partida acoplada à embreagem unidirecional. 
Imagem: https://www.youtube.com/watch?v=2CGfStxPaF8 — Não usei o vídeo porque só mostra o funcionamento de um conjunto defeituoso.

A embreagem unidirecional se acopla ao volante do motor e faz girar o virabrequim até que o pistão comece a trabalhar.

Assim que o motor da moto entra em funcionamento, a velocidade de giro do virabrequim é maior, bem maior do que a velocidade de giro do motor de partida.

Como a catraca permite o giro independente da engrenagem de partida em relação ao volante do motor, o movimento não é transmitido ao motor de partida e as engrenagens param de girar assim que o motor de partida é desligado.

Veja como a embreagem unidirecional atua neste outro vídeo.

Como existe a catraca, o motor de partida consegue fazer girar o virabrequim da moto, mas o virabrequim da moto nunca é capaz de girar o motor de partida.

Então não tem como um tranco danificar o motor de partida, a menos que alguém tente acionar o interruptor de partida durante o tranco, o que seria um contrassenso, porque o tranco só deve ser usado quando o motor de partida não está funcionando.

Do ponto de vista do motor de partida, ou mais exatamente, do ponto de vista das escovinhas do motor de partida, qual é a diferença entre o motor da moto estar girando por causa de um tranco ou pelo funcionamento normal?

Nenhuma. 

Que diferença faz se o virabrequim está girando por causa de alguém acionando o pedal de partida, a roda traseira girando com a marcha engrenada ou porque o motor da moto está funcionando?

É tudo a mesma coisa, a diferença de velocidade de giro entre uma peça e outra determina o desacoplamento automático do motor de partida.

Ou seja: Durante o tranco, o motor de partida não gira porque a embreagem unidirecional não deixa.

Resumindo:

As escovas do motor de partida se desgastam enquanto sua moto fica fazendo nhenhenhém para pegar, porque durante o tranco elas não são afetadas.

Tranco é um último recurso que você precisa conhecer para usar em uma emergência, sair do meio do mato com os cachorros correndo atrás. 

É um recurso perfeitamente válido para motos cujo único problema seja a bateria descarregada.

Funciona bem em motos carburadas, tem chance de não funcionar em motos com injeção eletrônica e dependendo do sistema elétrico da moto, funciona até com moto sem bateria nenhuma.

Fora isso, é blablablá de mecânico que provavelmente preferiria que você tivesse acionado a oficina para eles poderem cobrar o serviço de resgate.

Ou mostrarem como são bonzinhos não cobrando o resgate e incluindo o custo no preço dos serviços que você irá pagar.

Não existe almoço grátis. 

E sobre dicas para instalar um motor de partida novo:

Antes de tudo tenha certeza que o motor de partida realmente está danificado além de qualquer possibilidade de recuperação — ele é um dos equipamentos mais facilmente recondicionáveis do motor da moto, tem gente que até faz o rebobinamento em caso de espiras queimadas...
Imagem: Copiada na cara dura do vídeo do Vinícius em http://leaoesuamoto.blogspot.com.br/2015/01/remontando-o-motor-de-arranque.html

Um coletor (a pista onde correm as escovinhas) pode ser recuperado com lixa e reconstrução dos entalhes entre os segmentos dos pólos, rolamentos podem ser trocados.

As peças que se desgastam mais rapidamente são as escovas porque elas são de grafite. Mesmo assim Jezebel está com as escovas originais e ela já tem mais de 5 anos — até eu me surpreendo.

Escovas gastas são fáceis de trocar, a parte mais chata é a montagem, mas o Vinícius ensina uma técnica porreta no blog dele neste link aqui.

Não deixe de assistir o vídeo, é uma obra prima!


Um abraço,

Jeff

Um comentário:

  1. Boa dica, Victor!
    Pode ajudar muito na hora da necessidade!
    Um abraço,
    Jeff

    ResponderExcluir