Hoje na padoca (quarta-feira, 29/07) tive mais uma conversa com um proprietário de moto, sempre alertando para aquelas coisas que digo aqui no blog.
Desta vez foi com o proprietário de uma 600, que não cheguei a ver ou saber que modelo era, mas cujo proprietário estava tranquilo — ele sempre coloca 200 ml a mais e faz a troca do óleo religiosamente a cada 1000 km.
Imagem: http://www.returnofthecaferacers.com/2015/05/mad-max-fury-road-motorcycles.html
Falei pra ele que isso não bastava, porque o nível de óleo pode abaixar nesse meio tempo — tudo depende das condições em que a moto é usada.
Além disso, 200 ml provavelmente não são suficientes para atingir o nível máximo da vareta em um motor que provavelmente pede 2,7 litros.
Pela média dos outros motores, em que a falta é de mais ou menos 15%, esse motor talvez pedisse 3,1 litros e não apenas os 2,9 litros que ele deve estar colocando se o modelo for o que estou pensando. Mesmo assim, é melhor do que nada, o nível deve estar parando quase na metade da vareta.
Agora o que me deixou pasmo foi ele dizer que tem vez que faz a troca e saem apenas 600 ml de óleo de lá de dentro do motor...
Isso é aterrador, porque esse motor está quase seco de óleo.
Um motor funcionando com tão pouco óleo (apenas 20% do que deveria estar dentro do motor) é um seríssimo candidato a travamento e está na fila da retífica em curtíssimo prazo.
O momento em que esse motor disser chega, não aguento mais! poderá ser durante a ultrapassagem de um bitrem com uma carreta colada bem atrás aqui na BR-101, o trecho mais mortal do Brasil — e aí?
Esse sumiço do óleo pode ter duas origens:
Consumo normal de 1 ml a cada km é aceitável para rodagem em estrada com o acelerador bem aberto.
Com o óleo baixo, o consumo é ainda maior por causa do aquecimento excessivo do óleo.
Se ele usa a moto viajando, o óleo vai embora rapidinho e precisa ser reposto no mínimo a cada 500 km (300 km para motos pequenas).
Se ele não usa a moto em viagens, há outra origem possível que seria um vazamento grave sendo ignorado por não deixar manchas de óleo no piso.
Existe um vazamento que tem essa característica:
O vazamento através do retentor do eixo do pinhão de transmissão.
O óleo que vaza por ali acaba se espalhando pela corrente e acaba sendo confundido com o óleo normal de sua lubrificação.
Se a sua corrente está sempre lubrificada, apesar de você não a lubrificá-la com frequência, fique atento a isso.
E nunca, nunca em hipótese alguma deixe de repor o óleo consumido.
Nossa, eu não entendo como coisas como essas acontecem.
Na verdade, eu entendo sim — e é por isso que me preocupo tanto.
Por que os fabricantes não gastam 1% da verba de propaganda para fazer uma campanha de esclarecimento público sobre a importância do nível de óleo do motor, sua medição correta e sua reposição durante os intervalos entre trocas?
Por que os fabricantes não repreendem suas concessionárias que não cumprem as determinações para entregar as motos aos clientes com o nível correto de óleo (e não apenas com a quantidade que não atinge o nível correto de óleo)?
Somente publicar o manual do proprietário e lavar as mãos dizendo que "as informações foram dadas, quem não leu que se dane" é vergonhoso.
Ética e moralmente vergonhoso.
Os motores e as pessoas estão estourando por aí (no mínimo estão estourando seus orçamentos com os reparos), e as empresas só fazem contabilizar os lucros.
Isso é inaceitável sob todos os pontos de vista.
Um abraço,
Jeff
quinta-feira, 27 de agosto de 2015
quarta-feira, 26 de agosto de 2015
O retorno da carcaça do zumbi 2 - final final mesmo
Finalmente o final da história:
Começando de novo da estaca zero, eu já sabia que não podia pegar novamente aquele atalho para a Raposo Tavares.
Pelo menos o tempo tinha firmado e agora era só esperar a roupa secar. O bom é que o vento da moto faz isso. O ruim é que você gela.
Capa de chuva eu tinha desistido de usar desde que fiquei ridiculamente entalado tentando tirá-la para poder lanchar na padoca lá em Delfim Moreira. Muito trabalho para tirar, muito trabalho para colocar, melhor deixar molhar. Foi tirar a capa e começar a chover de novo... torrencialmente até Pouso Alegre.
Cruzando o contorno viário de Sorocaba me informei sobre como chegar a Piedade em um posto 24 horas e descobri que bastava seguir reto a avenida onde estávamos, cruzaríamos Sorocaba e chegaríamos em Piedade. Não tem como errar, disse o frentista. Logo se vê que ele não me conhece.
Imagem: Google Street View
Assim fizemos, cruzando Sorocaba deserta, mas respeitando os semáforos noturnos porque sempre pode aparecer alguém. E porque devia ter câmeras em todos os cruzamentos.
Durante o trajeto notei que Edith estava ligando a ventoinha, coisa que não deveria estar fazendo naquela condição de trânsito livre, a menos que estivesse com pouco líquido de arrefecimento.
Eu precisava achar um lugar seguro para reabastecer, não necessariamente um posto — o líquido de arrefecimento já estava comigo.
Quando viajo, levo roupas em um alforje e o outro vai lotado com óleo, líquido de arrefecimento, óleo de corrente, ferramentas, panos, lâmpadas, velas, o kit básico para uma manutenção sem depender de ninguém.
Parei do outro lado da rua em frente a um pátio onde havia um monte de carros de polícia e policiais estacionados, achei que ali seria seguro fazer a manutenção.
Reabasteci o reservatório e levantei a cabeça, os policiais todos tinham evaporado sem fazer barulho.
Ou assustamos a moçada com nosso visual badboy old man sem destino, ou estava na hora de passar algum bonde, comboio, sei lá... me mandei rapidinho e segui rumo a Piedade, agora sem erro porque havia placas indicando a próxima cidade. Hahahaha!
Era uma noite escurae tempestuosa, e até a semana passada o farol da Edith era uma piada não regulável original de fábrica, quando eu finalmente consegui ajustar — o processo vai virar postagem.
Mas durante a viagem, o farol alto estava mais para pigmeu, só iluminava bem o chão pelos 5 metros à frente, dali em diante era a estrada na escuridão, noite sem lua, breu total, trevas, o maior trevão.
Pegar no escuro uma estrada desconhecida, mal conservada, sem faixas refletivas, sem placas de sinalização e cercada de mato é algo desafiador, ainda mais com neblina.
Por sorte (ou azar?) apareceu um comboio (aha!) de três caminhões de minério.
Os caminhões de minério que circulam naquela região são desse tipo aqui, basculante de caçamba alta, acho que até mais alta do que essa:
Só que esse aí está novinho, lavado, bonitão...
Imagine três desses aí inteirinhos pintados de cinza escuro e cobertos de lama de minério de cor cinza escuro, com todos os refletivos cobertos de lama. Cinza escuro.
Facilitei a passagem para que eles iluminassem o caminho e fui atrás deles, pelo menos eu sabia para que lado era a próxima curva.
Era só manter uma distância suficiente para evitar alguma pedra ou lama voando e não deixar o pessoal se afastar.
E assim fomos, o comboio de três caminhões vazios colados um no outro, voando baixo, e nós na cola a uma distância prudente.
Dizer que eles iluminavam o caminho é relativo...
Dos três caminhões, um deles não acendia as lanternas traseiras. Adivinha qual? Justamente o último da fila.
A única coisa que se via era o halo de luz dos faróis dos caminhões da frente, e o vulto do caminhão de trás totalmente apagado. Parecia um comboio sobrenatural.
Imagem: Supernatural http://daughtershade.dreamwidth.org/219652.html
Era mais ou menos como seguir fantasmas, e essas aparições mandavam muito bem em uma estrada bastante esburacada — Edith eu fizemos cross-country atrás do comboio.
Ou a gente se mantinha atrás deles, ou penava com a falta de farol nas trevas — e o cansaço era tanto desde Campinas que eu não queria arriscar pilotar sem uma referência visual.
Extremamente cansado, eu precisava manter o foco nos caminhões, senão ia acabar desgarrando em alguma curva.
Com a visão limitada e foco total na bunda apagada do último caminhão — que também não tinha luz de freio, seta então nem pensar — a partir de um certo ponto a estrada ficou ainda mais esburacada.
Nunca na minha vida peguei uma estrada asfaltada tão ruim quanto aquela. Pensei no Alckmin, mas é impublicável.
Já não era mais cross-country, era o rally dos sertões. Pegando atalho por fora da estrada.
Imagina eu pilotando em pé nas plataformas e desviando dos buracos e crateras...
Mas não havia outra cidade naquela direção, então eles só podiam estar indo para Piedade, certo?
Errado.
Eram caminhões de minério, eles estavam vazios, estavam indo para o pátio da mineração para pegar mais carga.
Chegou um ponto em que a estrada seguiu reto e eles pegaram uma via secundária paralela à que estávamos...
Edith e eu continuamos na estrada principal, e foi bizarro ficar lado a lado com eles, processando a informação de que eu estava seguindo um pessoal porque eles iam para Piedade e no final eles não estavam indo para Piedade... naquele momento tive a intuição de que ia der marda.
Mas seguimos em frente porque estradas sempre ligam uma cidade a outra, e agora Piedade não podia estar muito longe.
No meio do breu apareceu uma luminosidade no horizonte, e era cedo para o dia clarear, então só podia ser Piedade... e chegamos lá eram quase quatro horas da manhã.
Piedade é uma cidade que eu conheço razoavelmente bem, visitava a trabalho há 25 anos... e estava muito mudada.
Estava tão mudada que eu não a reconheci desde a última vez que passei por lá... e isso tinha sido há menos de uma semana, na viagem de ida...
Bom, ainda estava escuro, mas depois de rodar algumas quadras ficou claro que aquela cidade não podia ser Piedade e eu não fazia a menor ideia de onde estávamos. Edith menos ainda.
É muito estranho seguir cansado, com a percepção alterada pela falta de dormir, percorrer um caminho esperando chegar a uma cidade e encontrar outra totalmente diferente... tudo apagado sem uma alma penada sequer.
Imagem: Silent Hill
Tudo deserto, nenhum comércio aberto, nenhum posto de gasolina, nenhum local para pedir informação, silêncio absoluto... parecia filme de terror.
Se aparecesse um fantasma ali naquela hora, pelo menos eu perguntava que lugar era aquele, mas nem isso.
Rodamos e rodamos e, para nossa salvação, encontramos o único prédio iluminado e em funcionamento em toda a cidade, a Santa Casa local, esta aqui (felizmente, sem zumbis — o único zumbi era eu):
Entrei e zumbizei ao funcionário da recepção onde estávamos — e descobri que estávamos em Salto de Pirapora.
— Zalto de Pirapora?
— Salto de Pirapora.
Para quem não conhece, Salto de Pirapora:
Mas como, perguntei eu, se é uma estrada reta entre Sorocaba e Piedade, e nós não saímos da estrada, como tínhamos ido parar em uma cidade totalmente fora da rota? Mais gasolina desperdiçada, eu ia ter de empurrar a moto já a partir de Curitiba...
— Para Piedade você tinha que ter contornado a rotatória. Seguindo reto você pegou a Estrada do Minério.
ESTRADA DO MINÉRIO!!!, pensei eu. Focking wulfe schmlitz gundam caminhões de minério!!!...
A Estrada do Minério é aquela linhazinha cinzenta no mapa aí de cima que o google nem considera como estrada de verdade...
Para entender o que aconteceu, só olhando no mapa. A SPA-104/079 é a tal rodovia do Minério... eu devia ter virado à esquerda em Albuquerque...
Seguindo os caminhões de perto e sem conseguir enxergar as placas de sinalização, não percebi a rotatória, segui a tendência da estrada e entrei pela pior carreira de buracos e desníveis de pista que você possa imaginar.
— E como eu faço para ir daqui até Piedade?
— Você vai ter de voltar pela Estrada do Minério até a rotatória para Piedade.
— Voltar toda aquela estrada esburacada? Não tem outro caminho?
— Tem, mas por Pilar do Sul é bem mais longe...
Não tinha mais ânimo de fazer aqueles 12 km de tortura e mais 16 km até Piedade.
O cansaço venceu, desabei e fiquei por lá mesmo.
E das quatro às seis da manhã, com a jaqueta por cima da cabeça, cruzei os braços e dormi sentado na recepção do hospital — lá também não tinha banco para deitar. Até pensei em fingir um piripaque para ver se ganhava uma maca, mas o pouco que restava da minha dignidade falou mais alto.
Não consegui dormir direito porque fiquei o tempo todo de sobreaviso. Vai que me levam a carcaça para o morgue.
Começou a amanhecer, começou a chegar gente para se consultar, hora de me mandar. Fiz o check-up básico — só da moto.
Estômago roncando, a última refeição tinha sido o almoço em Poços de Caldas, ainda tinha 760 km pela frente, eu não ia conseguir encarar o chão que faltava sem pelo menos um café da manhã. Eu ia precisar de muita energia para atravessar o Paraná inteiro e metade de Santa Catarina empurrando a moto sem gasolina.
E fomos para o posto Trevão, que apesar do nome é bem iluminado e tem esse nome por conta do enorme trevo na entrada da cidade. Boa padoca. Se errar o caminho e for parar em Salto de Pirapora, recomendo.
Um copão de café com leite e um pãozinho com manteiga às seis da manhã valem por uma refeição. Não valem não, mas era isso ou nada.
Hoje vendo os mapas para escrever esta postagem, descubro que se eu tivesse me informado no posto, teria descoberto que seguir em frente rumo a Pilar do Sul me levaria direto a Registro...
Eu teria economizado 10 km no percurso, e sem precisar pegar novamente a Estrada do Minério... Preciso experimentar esse caminho qualquer dia...
Mas o cansaço não te deixa pensar direito, e na minha cabeça o único mapa mostrava Piedade e então Juquiá... não tinha cabeça para trajetos alternativos.
Pegamos novamente a estrada cheia de buracos e descobri que a faixa de retorno era ainda mais esburacada, porque os caminhões saíam carregados do pátio da mineradora e estragavam ainda mais o asfalto.
Mas pelo menos era dia, ficava mais fácil desviar, e eu não tinha mais a pressa de chegar e dormir.
Fomos desviando dos sulcos cavados pelos pneus ao longo da pista e finalmente chegamos à rotatória e ao caminho certo para Piedade.
Em terreno conhecido, foi só pegar a estrada para Tapiraí e Juquiá, agora com asfalto decente.
Imagem: http://tapirai.wikia.com/wiki/História_de_Tapiraí
O sol começou a ficar forte lá pelas 9 da manhã e então eu descobri que havia esquecido o óculos de sol lá no Trevão.
Não havia gasolina para voltar, o jeito foi encarar o prejuízo e o sol forte nos olhos durante a manhã inteira, e eu sofro muito com luz intensa — mas não tenho pavor de alho. Já as estacas no coração matam qualquer um.
Depois de tantos eventos trevosos, eu tentava manter o ânimo pensando na recompensa de descer a serra de Juquiá, coisa que sempre é um prazer imenso...
...menos quando cai um temporal no dia anterior, e todas as curvas estão cobertas de lama e há árvores e barreiras caídas durante todo o trajeto, sorrateiras depois de cada curva fechada. Pô, nem isso para alegrar... o gostoso é descer em um dia de sol como esse aí do vídeo...
Descemos com cuidado redobrado porque cada curva era um risco de tombo, e uma laminha que para os carros não diz nada, para a gente é muito fácil de escorregar e cair.
E toca administrar ultrapassagens sem visão do pessoal apressadinho acostumado com as curvas e ultrapassando onde não dá para ultrapassar, preocupado em não cair. Eita, gente que não dá valor à própria vida nem à dos outros.
A estrada desce margeando o rio, o volume de água era grande, o fim da serra é na cidade de Juquiá, e eu tinha receio que a cidade estivesse alagada como aconteceu em 2014.
Reportagem: http://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/brasil/2014/02/17/mortes-causadas-pelas-chuvas-desde-dezembro-em-sp-superam-verao-passado.htm
Felizmente isso não aconteceu, mas durante o caminho notei que precisaria ajustar a corrente da Edith — a regulagem da Fenix Gold tem uma faixa de uso bastante pequena, a mínima folga excessiva e já está raspando na balança.
Chegamos a Juquiá às dez da manhã. Exausto no limite, pegar a BR-116 naquelas condições seria suicídio.
Como todos os meus movimentos são friamente calculados e com a roupa ainda molhada eu estava à beira da hipotermia, fui ao posto velho conhecido e estacionei a moto em um cantinho bem ensolarado.
Deitado ali atrás da moto, fiz o ajuste, o sol bateu gostoso, disfarcei que estava consertando a moto e aproveitei para dormir. E secar a roupa.
Nem deu tempo de largar, apaguei segurando a ferramenta. Essa frase ficou esquisita, mas era uma chave combinada de 21 mm.
Não fosse o frentista vir confirmar que eu não estava morto, tinha ficado ali até a hora do almoço.
Ops, eu fiquei ali até a hora do almoço... que eu não almocei.
Mais seco, descansado e lagarteado de volta à temperatura normal, segui viagem pela velha e conhecida rota das BR 116, 376 e 101 até pegarmos chuva novamente em Joinville. Sempre chove em Joinville.
Se teve algum lance emocionante nesse trecho até em casa, eu não lembro, pilotei no automático.
Só tenho na memória a vontade enorme de chegar em casa, e a passagem pelos restaurantes e lanchonetes onde não parei. Mas salivei.
A vontade de cair na cama depois de muitos e muitos quilômetros em uma semana era maior do que a fome.
Aí você me pergunta:
E a gasolina que te deixou tão preocupado o caminho todo?
Com o dinheirinho que sobrava fiz o último abastecimento em Barra Velha, a 125 km de casa, calculando que a autonomia de um tanque seria suficiente.
Mas não pude encher totalmente o tanque porque ainda precisava sobrar o suficiente para os pedágios, então não tinha certeza se conseguiríamos chegar ou não.
Edith aguentou exatamente até a garagem — no dia seguinte, assim que tentei ligar a moto, ela se recusou a funcionar e pediu reserva. Sorte que a filhota tinha dindin.
Mas o drama não acabou ali na garagem — chegar em casa não quer dizer conseguir entrar em casa...
Nos últimos 100 quilômetros eu vinha torcendo rezando implorando aos céus para que minha filha estivesse por lá, porque eu tinha deixado minhas chaves com ela. Se ela não estivesse em casa, eu ia ficar trancado do lado de fora...
Chegamos, estacionamos, retirei os alforjes e bagagens, fiz um cafuné de agradecimento na Edith e outro de saudade na Jezebel isso é muito importante, garante partidas fáceis depois de vários dias parada e acorrentei uma na outra para que colocassem os assuntos em dia e descansassem tranquilas.
Me arrastei escada acima doido de vontade de tomar um banho QUENTE (o último banho quente tinha sido em Minas Gerais, banho frio eu tomei a viagem inteira na ida e na volta) e poder finalmente descansar na minha cama.
Mas a Lei de Mutley não falha, é cruel e cínica.
Resignado, coloquei as coisas no chão no corredor do prédio, tirei a jaqueta e adivinha?
Encontrei o óculos de sol, que estava pendurado na gola da camiseta o tempo todo... um ponto positivo no final da viagem. Depois de ter torrado os zóio metade do caminho.
Fiz um travesseiro com a mochila e os alforjes, esparramei a jaqueta no chão, deitei ali mesmo e tentei dormir até minha filha voltar.
Mas viagens longas causam cãibras.... músculo que eu nem sabia que existia estava cãibrando e uivando de dor. E eu junto.
As cãibras começaram a se tornar contínuas, uma atrás da outra, e eu já não tinha mais força de esticar as pernas para evitar a contração dos músculos...
Dor, dor, dor e odor. Jaqueta molhada de 7 dias = cachorro molhado sem xampu.
Mas aí minha filha chegou, me ajudou a esticar as pernas, ajudou a me levantar, botou a jaqueta para lavar e tudo ficou perfeito. Jantar de primeira!
Apesar de todos os perrengues, o saldo foi uma boa aventura, cheia de emoção e suspense.
Só senti falta de um chapéu para poder dormir no corredor com a cara coberta. Preciso de um desses:
Não sei o porquê, mas depois desse dia os vizinhos passaram a me olhar torto.
Mas tudo bem...
Eles não têm histórias de 2660 km para contar.
Um abraço,
Jeff
Começando de novo da estaca zero, eu já sabia que não podia pegar novamente aquele atalho para a Raposo Tavares.
Pelo menos o tempo tinha firmado e agora era só esperar a roupa secar. O bom é que o vento da moto faz isso. O ruim é que você gela.
Capa de chuva eu tinha desistido de usar desde que fiquei ridiculamente entalado tentando tirá-la para poder lanchar na padoca lá em Delfim Moreira. Muito trabalho para tirar, muito trabalho para colocar, melhor deixar molhar. Foi tirar a capa e começar a chover de novo... torrencialmente até Pouso Alegre.
Cruzando o contorno viário de Sorocaba me informei sobre como chegar a Piedade em um posto 24 horas e descobri que bastava seguir reto a avenida onde estávamos, cruzaríamos Sorocaba e chegaríamos em Piedade. Não tem como errar, disse o frentista. Logo se vê que ele não me conhece.
Imagem: Google Street View
Assim fizemos, cruzando Sorocaba deserta, mas respeitando os semáforos noturnos porque sempre pode aparecer alguém. E porque devia ter câmeras em todos os cruzamentos.
Durante o trajeto notei que Edith estava ligando a ventoinha, coisa que não deveria estar fazendo naquela condição de trânsito livre, a menos que estivesse com pouco líquido de arrefecimento.
Eu precisava achar um lugar seguro para reabastecer, não necessariamente um posto — o líquido de arrefecimento já estava comigo.
Quando viajo, levo roupas em um alforje e o outro vai lotado com óleo, líquido de arrefecimento, óleo de corrente, ferramentas, panos, lâmpadas, velas, o kit básico para uma manutenção sem depender de ninguém.
Parei do outro lado da rua em frente a um pátio onde havia um monte de carros de polícia e policiais estacionados, achei que ali seria seguro fazer a manutenção.
Reabasteci o reservatório e levantei a cabeça, os policiais todos tinham evaporado sem fazer barulho.
Ou assustamos a moçada com nosso visual bad
Era uma noite escura
Mas durante a viagem, o farol alto estava mais para pigmeu, só iluminava bem o chão pelos 5 metros à frente, dali em diante era a estrada na escuridão, noite sem lua, breu total, trevas, o maior trevão.
Pegar no escuro uma estrada desconhecida, mal conservada, sem faixas refletivas, sem placas de sinalização e cercada de mato é algo desafiador, ainda mais com neblina.
Por sorte (ou azar?) apareceu um comboio (aha!) de três caminhões de minério.
Os caminhões de minério que circulam naquela região são desse tipo aqui, basculante de caçamba alta, acho que até mais alta do que essa:
Só que esse aí está novinho, lavado, bonitão...
Imagine três desses aí inteirinhos pintados de cinza escuro e cobertos de lama de minério de cor cinza escuro, com todos os refletivos cobertos de lama. Cinza escuro.
Facilitei a passagem para que eles iluminassem o caminho e fui atrás deles, pelo menos eu sabia para que lado era a próxima curva.
Era só manter uma distância suficiente para evitar alguma pedra ou lama voando e não deixar o pessoal se afastar.
E assim fomos, o comboio de três caminhões vazios colados um no outro, voando baixo, e nós na cola a uma distância prudente.
Dizer que eles iluminavam o caminho é relativo...
Dos três caminhões, um deles não acendia as lanternas traseiras. Adivinha qual? Justamente o último da fila.
A única coisa que se via era o halo de luz dos faróis dos caminhões da frente, e o vulto do caminhão de trás totalmente apagado. Parecia um comboio sobrenatural.
Imagem: Supernatural http://daughtershade.dreamwidth.org/219652.html
Era mais ou menos como seguir fantasmas, e essas aparições mandavam muito bem em uma estrada bastante esburacada — Edith eu fizemos cross-country atrás do comboio.
Ou a gente se mantinha atrás deles, ou penava com a falta de farol nas trevas — e o cansaço era tanto desde Campinas que eu não queria arriscar pilotar sem uma referência visual.
Extremamente cansado, eu precisava manter o foco nos caminhões, senão ia acabar desgarrando em alguma curva.
Com a visão limitada e foco total na bunda apagada do último caminhão — que também não tinha luz de freio, seta então nem pensar — a partir de um certo ponto a estrada ficou ainda mais esburacada.
Nunca na minha vida peguei uma estrada asfaltada tão ruim quanto aquela. Pensei no Alckmin, mas é impublicável.
Já não era mais cross-country, era o rally dos sertões. Pegando atalho por fora da estrada.
Imagina eu pilotando em pé nas plataformas e desviando dos buracos e crateras...
O asfalto era quase isso... só que era noite e a moto uma custom. Com a mesma eficiência do farol. |
Errado.
Eram caminhões de minério, eles estavam vazios, estavam indo para o pátio da mineração para pegar mais carga.
Chegou um ponto em que a estrada seguiu reto e eles pegaram uma via secundária paralela à que estávamos...
Edith e eu continuamos na estrada principal, e foi bizarro ficar lado a lado com eles, processando a informação de que eu estava seguindo um pessoal porque eles iam para Piedade e no final eles não estavam indo para Piedade... naquele momento tive a intuição de que ia der marda.
Mas seguimos em frente porque estradas sempre ligam uma cidade a outra, e agora Piedade não podia estar muito longe.
No meio do breu apareceu uma luminosidade no horizonte, e era cedo para o dia clarear, então só podia ser Piedade... e chegamos lá eram quase quatro horas da manhã.
Piedade é uma cidade que eu conheço razoavelmente bem, visitava a trabalho há 25 anos... e estava muito mudada.
Estava tão mudada que eu não a reconheci desde a última vez que passei por lá... e isso tinha sido há menos de uma semana, na viagem de ida...
Bom, ainda estava escuro, mas depois de rodar algumas quadras ficou claro que aquela cidade não podia ser Piedade e eu não fazia a menor ideia de onde estávamos. Edith menos ainda.
É muito estranho seguir cansado, com a percepção alterada pela falta de dormir, percorrer um caminho esperando chegar a uma cidade e encontrar outra totalmente diferente... tudo apagado sem uma alma penada sequer.
Imagem: Silent Hill
Tudo deserto, nenhum comércio aberto, nenhum posto de gasolina, nenhum local para pedir informação, silêncio absoluto... parecia filme de terror.
Se aparecesse um fantasma ali naquela hora, pelo menos eu perguntava que lugar era aquele, mas nem isso.
Rodamos e rodamos e, para nossa salvação, encontramos o único prédio iluminado e em funcionamento em toda a cidade, a Santa Casa local, esta aqui (felizmente, sem zumbis — o único zumbi era eu):
Entrei e zumbizei ao funcionário da recepção onde estávamos — e descobri que estávamos em Salto de Pirapora.
— Zalto de Pirapora?
— Salto de Pirapora.
Para quem não conhece, Salto de Pirapora:
Mas como, perguntei eu, se é uma estrada reta entre Sorocaba e Piedade, e nós não saímos da estrada, como tínhamos ido parar em uma cidade totalmente fora da rota? Mais gasolina desperdiçada, eu ia ter de empurrar a moto já a partir de Curitiba...
— Para Piedade você tinha que ter contornado a rotatória. Seguindo reto você pegou a Estrada do Minério.
ESTRADA DO MINÉRIO!!!, pensei eu. Focking wulfe schmlitz gundam caminhões de minério!!!...
A Estrada do Minério é aquela linhazinha cinzenta no mapa aí de cima que o google nem considera como estrada de verdade...
Para entender o que aconteceu, só olhando no mapa. A SPA-104/079 é a tal rodovia do Minério... eu devia ter virado à esquerda em Albuquerque...
Seguindo os caminhões de perto e sem conseguir enxergar as placas de sinalização, não percebi a rotatória, segui a tendência da estrada e entrei pela pior carreira de buracos e desníveis de pista que você possa imaginar.
— E como eu faço para ir daqui até Piedade?
— Você vai ter de voltar pela Estrada do Minério até a rotatória para Piedade.
— Voltar toda aquela estrada esburacada? Não tem outro caminho?
— Tem, mas por Pilar do Sul é bem mais longe...
Não tinha mais ânimo de fazer aqueles 12 km de tortura e mais 16 km até Piedade.
O cansaço venceu, desabei e fiquei por lá mesmo.
E das quatro às seis da manhã, com a jaqueta por cima da cabeça, cruzei os braços e dormi sentado na recepção do hospital — lá também não tinha banco para deitar. Até pensei em fingir um piripaque para ver se ganhava uma maca, mas o pouco que restava da minha dignidade falou mais alto.
Não consegui dormir direito porque fiquei o tempo todo de sobreaviso. Vai que me levam a carcaça para o morgue.
Começou a amanhecer, começou a chegar gente para se consultar, hora de me mandar. Fiz o check-up básico — só da moto.
Estômago roncando, a última refeição tinha sido o almoço em Poços de Caldas, ainda tinha 760 km pela frente, eu não ia conseguir encarar o chão que faltava sem pelo menos um café da manhã. Eu ia precisar de muita energia para atravessar o Paraná inteiro e metade de Santa Catarina empurrando a moto sem gasolina.
E fomos para o posto Trevão, que apesar do nome é bem iluminado e tem esse nome por conta do enorme trevo na entrada da cidade. Boa padoca. Se errar o caminho e for parar em Salto de Pirapora, recomendo.
Um copão de café com leite e um pãozinho com manteiga às seis da manhã valem por uma refeição. Não valem não, mas era isso ou nada.
Hoje vendo os mapas para escrever esta postagem, descubro que se eu tivesse me informado no posto, teria descoberto que seguir em frente rumo a Pilar do Sul me levaria direto a Registro...
Eu teria economizado 10 km no percurso, e sem precisar pegar novamente a Estrada do Minério... Preciso experimentar esse caminho qualquer dia...
Mas o cansaço não te deixa pensar direito, e na minha cabeça o único mapa mostrava Piedade e então Juquiá... não tinha cabeça para trajetos alternativos.
Pegamos novamente a estrada cheia de buracos e descobri que a faixa de retorno era ainda mais esburacada, porque os caminhões saíam carregados do pátio da mineradora e estragavam ainda mais o asfalto.
Mas pelo menos era dia, ficava mais fácil desviar, e eu não tinha mais a pressa de chegar e dormir.
Fomos desviando dos sulcos cavados pelos pneus ao longo da pista e finalmente chegamos à rotatória e ao caminho certo para Piedade.
Em terreno conhecido, foi só pegar a estrada para Tapiraí e Juquiá, agora com asfalto decente.
Tapiraí. |
O sol começou a ficar forte lá pelas 9 da manhã e então eu descobri que havia esquecido o óculos de sol lá no Trevão.
Não havia gasolina para voltar, o jeito foi encarar o prejuízo e o sol forte nos olhos durante a manhã inteira, e eu sofro muito com luz intensa — mas não tenho pavor de alho. Já as estacas no coração matam qualquer um.
Depois de tantos eventos trevosos, eu tentava manter o ânimo pensando na recompensa de descer a serra de Juquiá, coisa que sempre é um prazer imenso...
...menos quando cai um temporal no dia anterior, e todas as curvas estão cobertas de lama e há árvores e barreiras caídas durante todo o trajeto, sorrateiras depois de cada curva fechada. Pô, nem isso para alegrar... o gostoso é descer em um dia de sol como esse aí do vídeo...
Descemos com cuidado redobrado porque cada curva era um risco de tombo, e uma laminha que para os carros não diz nada, para a gente é muito fácil de escorregar e cair.
E toca administrar ultrapassagens sem visão do pessoal apressadinho acostumado com as curvas e ultrapassando onde não dá para ultrapassar, preocupado em não cair. Eita, gente que não dá valor à própria vida nem à dos outros.
A estrada desce margeando o rio, o volume de água era grande, o fim da serra é na cidade de Juquiá, e eu tinha receio que a cidade estivesse alagada como aconteceu em 2014.
Felizmente isso não aconteceu, mas durante o caminho notei que precisaria ajustar a corrente da Edith — a regulagem da Fenix Gold tem uma faixa de uso bastante pequena, a mínima folga excessiva e já está raspando na balança.
Chegamos a Juquiá às dez da manhã. Exausto no limite, pegar a BR-116 naquelas condições seria suicídio.
Como todos os meus movimentos são friamente calculados e com a roupa ainda molhada eu estava à beira da hipotermia, fui ao posto velho conhecido e estacionei a moto em um cantinho bem ensolarado.
Aquele canto onde está o fusca pega um solzinho da hora... |
Nem deu tempo de largar, apaguei segurando a ferramenta. Essa frase ficou esquisita, mas era uma chave combinada de 21 mm.
Não fosse o frentista vir confirmar que eu não estava morto, tinha ficado ali até a hora do almoço.
Ops, eu fiquei ali até a hora do almoço... que eu não almocei.
Impressionante o quanto um cochilo deitado ao sol é revigorante.
Mais seco, descansado e lagarteado de volta à temperatura normal, segui viagem pela velha e conhecida rota das BR 116, 376 e 101 até pegarmos chuva novamente em Joinville. Sempre chove em Joinville.
Se teve algum lance emocionante nesse trecho até em casa, eu não lembro, pilotei no automático.
Só tenho na memória a vontade enorme de chegar em casa, e a passagem pelos restaurantes e lanchonetes onde não parei. Mas salivei.
A vontade de cair na cama depois de muitos e muitos quilômetros em uma semana era maior do que a fome.
Aí você me pergunta:
E a gasolina que te deixou tão preocupado o caminho todo?
Com o dinheirinho que sobrava fiz o último abastecimento em Barra Velha, a 125 km de casa, calculando que a autonomia de um tanque seria suficiente.
Mas não pude encher totalmente o tanque porque ainda precisava sobrar o suficiente para os pedágios, então não tinha certeza se conseguiríamos chegar ou não.
Pilotando na maciota, com as últimas moedas paguei o último pedágio e no final a gasolina deu certinho contadinha para chegarmos em casa.
O alívio de chegar na minha cidade foi enorme. Qualquer coisa, era só ligar para o Daniel que teríamos socorro.
O alívio de chegar na minha cidade foi enorme. Qualquer coisa, era só ligar para o Daniel que teríamos socorro.
Edith aguentou exatamente até a garagem — no dia seguinte, assim que tentei ligar a moto, ela se recusou a funcionar e pediu reserva. Sorte que a filhota tinha dindin.
Mas o drama não acabou ali na garagem — chegar em casa não quer dizer conseguir entrar em casa...
Nos últimos 100 quilômetros eu vinha torcendo rezando implorando aos céus para que minha filha estivesse por lá, porque eu tinha deixado minhas chaves com ela. Se ela não estivesse em casa, eu ia ficar trancado do lado de fora...
Chegamos, estacionamos, retirei os alforjes e bagagens, fiz um cafuné de agradecimento na Edith e outro de saudade na Jezebel isso é muito importante, garante partidas fáceis depois de vários dias parada e acorrentei uma na outra para que colocassem os assuntos em dia e descansassem tranquilas.
Me arrastei escada acima doido de vontade de tomar um banho QUENTE (o último banho quente tinha sido em Minas Gerais, banho frio eu tomei a viagem inteira na ida e na volta) e poder finalmente descansar na minha cama.
Mas a Lei de Mutley não falha, é cruel e cínica.
Nem preciso dizer que justamente naquela tarde minha filha saiu para fazer compras a fim de preparar um jantar de boas vindas...
Resignado, coloquei as coisas no chão no corredor do prédio, tirei a jaqueta e adivinha?
Encontrei o óculos de sol, que estava pendurado na gola da camiseta o tempo todo... um ponto positivo no final da viagem. Depois de ter torrado os zóio metade do caminho.
Fiz um travesseiro com a mochila e os alforjes, esparramei a jaqueta no chão, deitei ali mesmo e tentei dormir até minha filha voltar.
Mas viagens longas causam cãibras.... músculo que eu nem sabia que existia estava cãibrando e uivando de dor. E eu junto.
As cãibras começaram a se tornar contínuas, uma atrás da outra, e eu já não tinha mais força de esticar as pernas para evitar a contração dos músculos...
Dor, dor, dor e odor. Jaqueta molhada de 7 dias = cachorro molhado sem xampu.
Mas aí minha filha chegou, me ajudou a esticar as pernas, ajudou a me levantar, botou a jaqueta para lavar e tudo ficou perfeito. Jantar de primeira!
Apesar de todos os perrengues, o saldo foi uma boa aventura, cheia de emoção e suspense.
Só senti falta de um chapéu para poder dormir no corredor com a cara coberta. Preciso de um desses:
Não sei o porquê, mas depois desse dia os vizinhos passaram a me olhar torto.
Mas tudo bem...
Eles não têm histórias de 2660 km para contar.
Um abraço,
Jeff
PS: Me lembre de contar o passeio com a filhota até Urubici, aquele em que pegamos muita chuva na BR-282... só pra variar.
terça-feira, 25 de agosto de 2015
Fique bem longe de ônibus e caminhões manobrando
Fique longe de ônibus e caminhões manobrando — veja este vídeo e entenda o porquê.
Reportagem e vídeo: http://g1.globo.com/bahia/noticia/2015/08/camera-de-seguranca-flagra-onibus-derrubando-ciclista-em-camacari.html
Assista a reportagem neste link ou no vídeo abaixo e entenda como o perigo pode sobrar para você, mesmo estando a uma boa distância.
Quem teve culpa por este acidente?
O motorista do ônibus que não imaginou que apareceria um ciclista enquanto ele dava ré e prestava atenção ao outro lado?
Ou o ciclista que não imaginou que o ônibus poderia começar a se mover e passou muito perto, sem manter uma distância de segurança?
Na minha opinião, o acidente não teria acontecido se o ciclista tivesse sido mais prudente.
O ciclista, assim como o motociclista, sempre devem considerar a possibilidade de não serem vistos pelos motoristas.
Ou por estarem escondidos nos pontos cegos dos espelhos, ou por serem pouco visíveis e escaparem da visão periférica dos motoristas, ciclistas e motociclistas são responsáveis por não se colocarem em situações perigosas.
Ao decidir ultrapassar, o ciclista não considerou que o ônibus poderia se deslocar para a frente e derrubá-lo, e muito menos imaginou a possibilidade de o ônibus engatar a ré e derrubá-lo. Confesso que nem eu.
Ao ultrapassar sem margem de segurança, foi colhido, derrubado e acabou derrubando o motociclista.
Apesar de tudo isso, o motorista do ônibus errou gravemente ao não parar para prestar socorro.
Ao se omitir e abandonar o local, chamou para si toda a culpa por um acidente no qual teria atenuantes razoáveis.
Felizmente existem cada vez mais câmeras para flagrar esses momentos, mostrando para todos a dinâmica dos acidentes e tornando todos mais conscientes das situações potencialmente perigosas a serem evitadas.
O que este acidente nos ensina é que um evento anormal na pista oposta, como a manobra de um ônibus ou caminhão, uma obra, um carro saindo de uma garagem, etc., também pode gerar um efeito cascata potencialmente perigoso para nós motociclistas em nossa mão de direção.
O mais prudente sempre será ficar longe desses grandalhões.
Um abraço,
Jeff
segunda-feira, 24 de agosto de 2015
Por que pilotos experientes abusam e caem?
O RobertyR7 diz tudo no vídeo.
Assista e veja como a vida é cheia de ironia...
Demonstração prática do motivo de nunca começar de cara com uma moto potente de 500 para cima.
Motos são traiçoeiras e tombos bobos acontecem.
Se caindo a 65 km/h você torce o pé, com uma 600 você cai a 100 km/h e tem enorme chance de se matar. Ou se quebrar inteiro. E tomar um prejuízo lascado.
Ou bate a 200 km/h e se mata.
Reportagem: http://g1.globo.com/goias/transito/noticia/2015/08/casal-morre-apos-colisao-entre-moto-e-caminhonete-na-br-060-em-goias.html — estou preparando uma postagem específica sobre este acidente, só falta conseguir extrair um vídeo.
Por que o tombo do vídeo do RobertyR7 aconteceu?
Porque ele deitou demais a moto a ponto de a pedaleira não apenas raspar durante a curva, mas fazer um ponto de apoio, tirando a roda traseira do chão.
A moto deu uma chicotada e lançou ele longe.
Se tivessem filmado do lado de fora, o tombo seria muito parecido com este aqui — note como o som da pedaleira raspando é idêntico:
Este vídeo foi mostrado na postagem Chicotadas e curvas. Outra postagem que fala desse problema em curvas é a postagem Até onde posso inclinar minha moto.
Nos dois vídeos dá para ouvir a pedaleira raspando no chão antes de os pilotos perderem o controle — se tivessem aliviado o acelerador, poderiam ter corrigido a trajetória e talvez evitado o tombo.
Mas por que caras experientes cometem esse erro?
No caso do vídeo do RobertyR7, um dos motivos pode ser porque até outro dia ele estava acostumado com outra moto maior, uma XJ6.
Ele conta neste outro vídeo que vendeu a 600 porque cansou de tomar multa por escape esportivo, espelho pequeno e velocidade. Cidade pequena, todo mundo te conhece, inclusive a polícia...
Passou a usar uma Fazer e, preocupado em mostrar os limites da moto no vídeo, acabou inclinando demais e não conseguiu fazer a curva.
Mudar de uma moto para outra, realizar ajustes em comandos, até mesmo trocar de calçado exige reaprender as reações que a moto terá na nova condição.
Contribuiu para o acidente a preocupação em conseguir uma filmagem interessante mostrando a moto raspando a pedaleira...
Muitos motofilmadores acabam se envolvendo em acidentes evitáveis e esse é um fator que pode estar influenciando esse tipo de acidente.
O fator adrenalina da moto também colabora.
Veja este outro vídeo:
Você vai se empolgando com a estrada e começa a pilotar cada vez mais rápido, testando os seus limites.
É aquele negócio, "vou lá buscar e mostrar como é que se faz"...
A adrenalina te estimula e você literalmente perde a noção.
Pausa para explicar como funciona a adrenalina:
Imagine que você é um homem das cavernas ou uma mulher das cavernas ou um cidadã@ transgêner@ das cavernas (se bem que ainda não existiam cidadãos e cidadãs porque as cidades ainda não tinham sido inventadas):
Você sai pela manhã para caçar um coelho, colher umas frutas ou filosofar quanto ao sentido da vida. É 42, mas você ainda não inventou a má temática.
Quando volta para casa você encontra instalado em sua cama das cavernas um enorme, cheio de dentes e faminto urso das cavernas. E não é o ex-Zé Colmeia agora Yogi Bear.
Antes que você tenha tempo de falar UGH!, suas glândulas supra... super... ahn... — aquelas que você aprendeu na escola — descarregam uma dose intensa de adrenalina que faz você ficar ligadão e voar mais rápido que o ex-Super-Homem agora Superman das cavernas.
A adrenalina produz estamina, um combustível super energético que te fará correr uma distância maior que um maratonista das cavernas.
Depois de algum tempo esse combustível adicional acaba, as pernas começam a tremer e você só consegue dizer UGABUGAUGAUGAUGABABABUGABUGA!
Imagem: http://www.agirnow.com.br/blog/2015/07/desastres-naturais-no-cinema-e-na-literatura-o/
É para isso que serve a adrenalina.
O problema é que pilotando uma moto você não gasta a estamina, e só vai acumulando adrenalina, fazendo o coração bater cada vez mais rápido — você se acostuma com o alto nível de adrenalina, não percebe que está ligado em 440 volts e não descarrega a energia. Correndo com os pés.
O detalhe é que a sua percepção do tempo sem relógio nem celular é ditada pelos batimentos do coração.
Com o coração a mil, sua percepção do mundo se torna irreal.
Você vira um ex-Mercúrio agora Quicksilver das cavernas pilotando uma moto com tecnologia dos séculos 20 ou 21.
Imagem: https://marvelupdates1.wordpress.com/2015/07/18/evan-peters-teases-bigger-and-better-quicksilver-scene-in-x-men-apocalypse/
Você não percebe que a moto está rápida demais para aquela curva ali na frente — você perde a noção do limite.
Se você não perceber que isso está acontecendo, vai chegar uma hora em que você encontrará o limite, e às vezes a pilotagem terá conserto e outras vezes não terá não.
Muito cuidado na hora de descobrir quais são os seus limites e os limites da moto.
Por mais que você seja experiente, um pequeno fator despercebido como a falta de adaptação suficiente a um modelo novo ou a influência sutil e crescente da adrenalina podem causar uma queda.
Tenha consciência do efeito da adrenalina durante a pilotagem esportiva para maneirar no acelerador antes de perder o controle.
Quedas de moto nem sempre acabam apenas com um pé torcido.
Um abraço,
Jeff
Assista e veja como a vida é cheia de ironia...
Demonstração prática do motivo de nunca começar de cara com uma moto potente de 500 para cima.
Motos são traiçoeiras e tombos bobos acontecem.
Se caindo a 65 km/h você torce o pé, com uma 600 você cai a 100 km/h e tem enorme chance de se matar. Ou se quebrar inteiro. E tomar um prejuízo lascado.
Ou bate a 200 km/h e se mata.
Reportagem: http://g1.globo.com/goias/transito/noticia/2015/08/casal-morre-apos-colisao-entre-moto-e-caminhonete-na-br-060-em-goias.html — estou preparando uma postagem específica sobre este acidente, só falta conseguir extrair um vídeo.
Por que o tombo do vídeo do RobertyR7 aconteceu?
Porque ele deitou demais a moto a ponto de a pedaleira não apenas raspar durante a curva, mas fazer um ponto de apoio, tirando a roda traseira do chão.
A moto deu uma chicotada e lançou ele longe.
Se tivessem filmado do lado de fora, o tombo seria muito parecido com este aqui — note como o som da pedaleira raspando é idêntico:
Este vídeo foi mostrado na postagem Chicotadas e curvas. Outra postagem que fala desse problema em curvas é a postagem Até onde posso inclinar minha moto.
Nos dois vídeos dá para ouvir a pedaleira raspando no chão antes de os pilotos perderem o controle — se tivessem aliviado o acelerador, poderiam ter corrigido a trajetória e talvez evitado o tombo.
Mas por que caras experientes cometem esse erro?
No caso do vídeo do RobertyR7, um dos motivos pode ser porque até outro dia ele estava acostumado com outra moto maior, uma XJ6.
Ele conta neste outro vídeo que vendeu a 600 porque cansou de tomar multa por escape esportivo, espelho pequeno e velocidade. Cidade pequena, todo mundo te conhece, inclusive a polícia...
Passou a usar uma Fazer e, preocupado em mostrar os limites da moto no vídeo, acabou inclinando demais e não conseguiu fazer a curva.
Mudar de uma moto para outra, realizar ajustes em comandos, até mesmo trocar de calçado exige reaprender as reações que a moto terá na nova condição.
Contribuiu para o acidente a preocupação em conseguir uma filmagem interessante mostrando a moto raspando a pedaleira...
Muitos motofilmadores acabam se envolvendo em acidentes evitáveis e esse é um fator que pode estar influenciando esse tipo de acidente.
O fator adrenalina da moto também colabora.
Veja este outro vídeo:
Você vai se empolgando com a estrada e começa a pilotar cada vez mais rápido, testando os seus limites.
É aquele negócio, "vou lá buscar e mostrar como é que se faz"...
A adrenalina te estimula e você literalmente perde a noção.
Pausa para explicar como funciona a adrenalina:
Imagine que você é um homem das cavernas ou uma mulher das cavernas ou um cidadã@ transgêner@ das cavernas (se bem que ainda não existiam cidadãos e cidadãs porque as cidades ainda não tinham sido inventadas):
Você sai pela manhã para caçar um coelho, colher umas frutas ou filosofar quanto ao sentido da vida. É 42, mas você ainda não inventou a má temática.
Quando volta para casa você encontra instalado em sua cama das cavernas um enorme, cheio de dentes e faminto urso das cavernas. E não é o ex-Zé Colmeia agora Yogi Bear.
Antes que você tenha tempo de falar UGH!, suas glândulas supra... super... ahn... — aquelas que você aprendeu na escola — descarregam uma dose intensa de adrenalina que faz você ficar ligadão e voar mais rápido que o ex-Super-Homem agora Superman das cavernas.
A adrenalina produz estamina, um combustível super energético que te fará correr uma distância maior que um maratonista das cavernas.
Depois de algum tempo esse combustível adicional acaba, as pernas começam a tremer e você só consegue dizer UGABUGAUGAUGAUGABABABUGABUGA!
Imagem: http://www.agirnow.com.br/blog/2015/07/desastres-naturais-no-cinema-e-na-literatura-o/
É para isso que serve a adrenalina.
O problema é que pilotando uma moto você não gasta a estamina, e só vai acumulando adrenalina, fazendo o coração bater cada vez mais rápido — você se acostuma com o alto nível de adrenalina, não percebe que está ligado em 440 volts e não descarrega a energia. Correndo com os pés.
O detalhe é que a sua percepção do tempo sem relógio nem celular é ditada pelos batimentos do coração.
Com o coração a mil, sua percepção do mundo se torna irreal.
Você vira um ex-Mercúrio agora Quicksilver das cavernas pilotando uma moto com tecnologia dos séculos 20 ou 21.
Você não percebe que a moto está rápida demais para aquela curva ali na frente — você perde a noção do limite.
Se você não perceber que isso está acontecendo, vai chegar uma hora em que você encontrará o limite, e às vezes a pilotagem terá conserto e outras vezes não terá não.
Muito cuidado na hora de descobrir quais são os seus limites e os limites da moto.
Por mais que você seja experiente, um pequeno fator despercebido como a falta de adaptação suficiente a um modelo novo ou a influência sutil e crescente da adrenalina podem causar uma queda.
Tenha consciência do efeito da adrenalina durante a pilotagem esportiva para maneirar no acelerador antes de perder o controle.
Quedas de moto nem sempre acabam apenas com um pé torcido.
Um abraço,
Jeff
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