quinta-feira, 25 de junho de 2015

Um amigo está vendendo uma motona, será minha primeira moto

Comentário feito pelo leitor Ygor — obrigado por acompanhar o blog! — na postagem Um novato e uma moto potente, aquela do shit shit shit.

Se você ainda não viu o vídeo, veja de novo porque é muito instrutivo para os novatos — e por novato eu quero dizer novato em pilotar uma moto, não necessariamente alguém recém habilitado. Os comentários entre [] são meus.



Jeff, coloca mais ênfase na palavra novato, porque muito além da inexperiência de 90% das pessoas que compram uma moto de alto rendimento como primeira moto, ela compra na bacia das almas e às vezes mal sobra dinheiro para a gasolina.

Enfim, o que quero dizer é que esse pessoal coloca a moto com valor maior que a própria vida, é dessa inversão de valores que estou falando.


Um motociclista que subiu os degraus sabe o devido valor de cada coisa.


Nesse caso [do acidente do vídeo] seria preferível bater na traseira do caminhão do que cair entre eles perigando ficar embaixo de suas rodas.


Em última instância já no corredor da morte ele teria de travar os braços e abrir mão dos seu caríssimos retrovisores, além do que, posso estar enganado, mas cabia quase outra carreta ali no meio kkkk [hehehehe].


O maior problema dos novatos é social, no Brasil devia ter sim escala de categoria na categoria A, na B nem tanto. 


Me desculpe, sou motociclista e andar de carro é totalmente diferente de andar de moto, e devíamos ter um seguro obrigatório como na Austrália.


O bonito de 18, 19 anos quer andar de Hayabusa, que bom, pode sim, pague o valor dela em seguro obrigatório a terceiros, e o valor do seguro iria diminuindo na medida em que a experiência aumentasse, assim a última categoria de carta não precisaria desse seguro.


O que o Ygor falou é muito importante:

Você pode ter 20 anos de habilitação em carros, mas uma moto é realmente algo totalmente diferente, motos são traiçoeiras e cheias de manhas e mumunhas. 

Jessica Rabbit à cata de um coelho

É por isso que eu as amo — são traiçoeiras quando você pisa na bola, mas não por vontade própria. 

Elas não são más. Apenas são levadas a esse caminho. O trocadilho no inglês é ótimo.

Concordo que deveria haver uma escala gradativa para a habilitação, ninguém deveria poder começar direto com uma moto muito potente sem antes passar por um período significativo com motos menores.

A capacitação deveria ser no mínimo anual e em 3 ou 4 níveis de cilindrada / potência — superesportiva só perto dos 25 anos, que é a idade do juízo para muitos. Não todos. 

Isso salvaria muitas vidas, mas iria contra os interesses econômicos de muita gente, afinal as motos pequenas mantêm a concessionária / empresa funcionando, mas o lucro mais gordo vem da venda das motos grandes.

Alguns macetes de manutenção inexistentes nos carros — como a regulagem periódica da corrente ou a medição do nível de óleo do motor/câmbio com procedimento diferente daquele que você conheceu a vida inteira — podem causar acidentes e danos graves, só que ninguém fala isso na hora de te vender a moto. 

Mas não é só o bonito (para a mãe dele) de 18 ou 19 anos que cai nessa armadilha de comprar de cara uma moto muito potente. 

O pessoal da minha geração (nasci em 1961, tinha 8 anos quando Armstrong e Aldrin pousaram na Lua e o coitado do Collins ficou lá dando voltas e foi esquecido pela História)...ops, devaneando de novo...

Como dizia, é comum o pessoal da minha geração chegar na idade da realização plena, filhos criados, síndrome do berço vazio, vida caindo em uma rotina sem graça...

Chega uma hora, ele se cansa da monotonia e fala: 


Quer saber? Vou fazer o que sempre tive vontade, mas nunca fiz porque o trabalho, o casamento, o compromisso de criar os filhos nunca deixou.


Aí o tiozão sujeito em questão resolve se dar de presente uma moto.


Depois do divórcio (ou não), se sobrar alguma coisa, o cara opta por comprar a moto mais vistosa que o seu saldo bancário puder se comprometer a financiar em 50 meses com taxa 0% (porque os juros exorbitando a Lua já estão embutidos no preço). O coitado não imagina o que ele vai gastar com a manutenção da moto, aí quem ainda não está divorciado acaba se divorciando de vez.

Esse é um dos maiores erros que o novato pode cometer, o de já começar de cara com uma moto grande e potente, falo isso desde a primeira postagem.

O velhote homem maduro de meia idade parte de cara para comprar uma moto de cilindrada 600, 900, 1200, 1800... se aparecer maior vai acabar comprando também.


E aí descobre algumas verdades doloridas da vida. Ou acaba com ela de vez, como quase fez o rapaz do shit shit shit.


No vídeo ele afirma que não conseguiu frear. E por ser novato, não usou o freio motor, que nas motos pode ser muito mais intenso do que nos carros — se você souber reduzir as marchas.


O sujeito se apavorou e não conseguiu dominar a moto para passar em um espaço estreito em que qualquer um passaria, acabou dançando e só não morreu por pura sorte. E porque o Vadão não tava lá.

Imagem: http://www.buzzpirates.com/2009/07/the-ballad-of-porkins-the-fat-guy-pilots-death-in-star-wars/

Essa inexperiência também se deve ao fato de que em outros países o uso do corredor é punido rigorosamente, mesmo com o trânsito parado, então ele nunca tinha feito aquilo na vida.

O cara tiozão tira a moto da concessionária e pensa que sabe tudo de trânsito porque dirige carro há 30 anos.


Mas andar de carro é fácil, basta acelerar, não bater no carro da frente, não atropelar ninguém e saber fazer baliza. 


O carro tem quatro rodas, ele não cai.


De moto você tem que aprender a ler cada particularidade do trânsito.


Você precisa analisar os riscos potenciais a todo instante, não basta prestar atenção só no carro na sua frente.


É necessário perceber que o trânsito está parando 200 metros lá na frente para que você possa parar sem cair aqui atrás. 


Você precisa começar a frear junto com aquele cara do 4º ou 5º carro lá na frente, muito antes de o motorista do carro que você não quer bater meter o pé no freio.

Você precisa ficar o tempo todo de radar ligado detectando possíveis ameaças e planejando maneiras de escapar dos imprevistos, porque alguém vai entrar na sua frente, é certeza.


Se você se basear apenas na sua experiência com carros, ficará travado sem saber o que fazer na hora do perigo, e travar no comando de uma moto pode ser fatal.


Foi o que aconteceu com esta menina que não teve reação imediata ao ver um carro se aproximando na contramão:


Vídeo e reportagem: http://g1.globo.com/mato-grosso/noticia/2015/06/imagens-mostram-atropelamento-de-mulher-em-avenida-de-cuiaba.html

Infelizmente ela não sobreviveu, mas se tivesse desviado para o posto assim que viu o carro na contramão, hoje ela poderia estar contando a história para os amigos... é muito triste.

Esse tipo de traquejo você não aprende na auto ou motoescola.


Você só tem chance de aprender com uma moto pequena.


O novato acostumado a sentar no banco do motorista pensa que é a mesma coisa com uma moto, só sentar e acelerar. 


A pilotagem envolve prontidão do piloto e capacidade de usar o corpo todo rapidamente para realizar manobras de emergência. Sua vida pode depender disso um dia, então você precisa estar sempre ligado em tudo que se passa.


Comece com uma moto pequena (o prejuízo inevitável dos espelhos, piscas e manetes quebrados da primeira moto será bem menor) e adquira esse traquejo que é cada vez mais exigente de força física e prontidão quanto maior for a capacidade de aceleração de sua moto.

Quanto ao seguro obrigatório, o que penso é que toda vida é valiosa, independente de o cara poder comprar uma Vayabusa aos 18 anos, e um seguro para terceiros só resolveria o problema do conserto do veículo dos terceiros... não traria vidas de volta.

Então prefiro continuar minha campanha de conscientização para que até mesmo o carinha filho daquele cara envolvido no escândalo político financeiro do dia da hora do último minuto não se mate e não mate algum inocente no trânsito. Já o pai dele, quero mais é que se утконос.

Ah, mais uma coisa:

Não se iluda de começar com uma moto custom pensando que motos custom são motos pacatas que você compra para desfilar no fim de semana e não para andar em alta velocidade.

Uma custom potente (não uma Kansas) consegue acelerar mais rápido do que uma esportiva em uma arrancada do zero (é sério) porque  tem muito mais torque, e em compensação também é muito mais difícil de parar e equilibrar devido ao peso maior. 



Só isso já é suficiente para o novato se atrapalhar todo. 

E você sabe quanto custa um tombo com uma esportiva ou uma custom?


Mais do que você perdeu ou certamente perderá no divórcio. 


Um abraço,


Jeff


Outra postagem relacionada: 
Minha primeira moto será uma alta cilindrada (500 para cima)

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