sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Será que a harley-davidson vai pelo caminho das Indians?

Problemas de engenharia do produto como esses das motos da indian e quadriciclos da polaris das postagens anteriores não afetam somente esses fabricantes.

Ou melhor, não afetam somente os consumidores dos produtos desses fabricantes.


Eu citei os recalls da indian, assim como poderia ter citado os recalls da harley-davidson...

Imagem e reportagem: http://correio.rac.com.br/_conteudo/2015/07/especial_correio/canal_motor/306564-harley-davison-comunica-recall-das-motocicletas-touring-e-cvo.html

Também foram 7 modelos com problemas na fixação dos alforges laterais — eles podiam se desprender e cair com a moto em movimento.


Ou então o outro recall recente da harley-davidson pelo risco pavoroso de falha completa do freio dianteiro...

Reportagem: http://g1.globo.com/carros/motos/noticia/2014/06/harley-davidson-faz-recall-de-motos-por-problema-no-freio.html

Aliás, para a harley, eu prevejo uma coisa.


Prever não é a palavra, porque não sou bidu nem tenho bola de cristal.


Mas tenho intuição de que a harley irá passar pelos mesmos perrengues de recall de motocicletas que a indian.


E por motivos muito semelhantes.

Este é o novo motor Milwaukee-Eight 114 da h-d
lançado no meio do ano passado:
Imagem, reportagem e vídeo: http://www.motorcycledaily.com/2016/08/harley-makes-new-milwaukee-eight-engines-official-with-video/

Ele está equipando as motos da harley-davidson a partir de alguns modelos 2017 lançados em meados de 201
6.

A grande novidade é o esfriamento líquido por óleo e também água dos cabeçotes dos motores — isso é quase inédito na linha de motores grandes da harley, a única exceção era a V-Rod, um caso à parte.

O projeto do motorzão 114 é inédito em termos de Engenharia:

O motor não mantém a água com aditivo (líquido de arrefecimento) circulando o tempo todo.
Imagem e reportagem: https://ultimatemotorcycling.com/2016/08/25/2017-harley-davidson-milwaukee-eight-motors-11-fast-facts/

A decisão de usar a circulação independente de óleo, água ou ambos — dependendo da situação no momento — será tomada por gerenciamento eletrônico do motor.

Isso permite usar um radiador de água menor do que o tradicional. 

Arrefecimento líquido é uma mudança radical para uma empresa que sempre se orgulhou de manter a tradição de não usar esse recurso.

Na visão dos americanos, a Harley "clássica" é sinônimo de motocicleta.

Arrefecimento líquido é coisa das modernosas e desprezadas (pelos americanos mais xenófobos) motos japonesas de baixa cilindrada. Afinal, eles lutaram contra os japoneses na 2ª guerra.
Imagem: Bōsōzoku, um estilo de customização totalmente oriental. https://br.pinterest.com/ibuki1016/motorcycle/

Humm... ahn... bem... ai, misericórdia... deixa pra lá.


A V-Rod da harley já usava o arrefecimento líquido comum desde 2001, mas foi um motor desenvolvido em parceria com a alemã Porsche.
Imagem e histórico: https://en.wikipedia.org/wiki/Harley-Davidson_VRSC

Ela não é considerada uma "Verdadeira Harley" pelos fãs tradicionais fiéis à marca — justamente por causa da "abominação" da modernidade e do radiador. Afinal, eles lutaram contra os alemães na 2ª guerra.

Os modelos Street 500 e 750 lançados em 2013 também usam radiador, mas são motos desenvolvidas de olho no mercado mundial.

Lá nos EUA as Street 500 e 750 são consideradas "moto de menina". Adolescente.
Imagem e reportagem: http://thekneeslider.com/harley-davidson-liquid-cooled-street-750-and-street-500/

Aquele mercado enxerga Harleys puros-sangues como a Sportster 883 e a Sportster 1200 meras "motos de entrada" ou "motos para iniciantes".
  
Imagem e histórico: https://en.wikipedia.org/wiki/Harley-Davidson_Sportster

As cavalonas tradicionais de motor 1.600 e 1.800 cmque carregam a imagem da empresa passando a usar um radiador seriam rejeitadas pelo forte mercado americano — poderia haver uma migração em massa para a rival secular indian.

Por esse motivo os engenheiros da harley cortaram um doze para conseguir manter a aparência de uma moto tradicional de motor esfriado exclusivamente a ar.

Externamente o novo motor terá a aparência típica de sempre, mas os engenheiros compactaram o projeto para permitir a inclusão de todos os novos recursos e componentes.
Imagem e reportagem: http://www.forbes.com/sites/jasonfogelson/2016/08/28/harley-davidsons-new-milwaukee-eight-engine-debuts-in-2017-touring-motorcycle-lineup/#37db42b2b06e

Sim, a foto é de uma moto já com o novo motor e o radiador e todo o resto ocultos no quadro.


Praticamente fizeram mágica para esconder completamente o radiador, acessórios e mangueiras no quadro das novas motos modelo 2017.

E é bem aí que mora o perigo:


O motor tradicional da harley já mal cabia no chassi.


A troca das velas de ignição já era impossível de se fazer sem a desmontagem da moto — aquele espírito easy rider de resolver as tretas e pipocos no meio da estrada morreu faz tempo.


Para não ser passada para trás pelo motor Thunder Stroke de 111 polegadas cúbicas da indian, a harley aumentou a cilindrada do M
ilwaukee-Eight para 114 pol.3, o que dá 1.868 cm3.
Imagem e reportagem: https://ultimatemotorcycling.com/2016/08/25/2017-harley-davidson-milwaukee-eight-motors-11-fast-facts/

a harley atochou ainda mais coisas no quadro e no motor que a indian, que já teve problemas sérios por causa disso.

Com tanta coisa atulhada nessa moto, eu prevejo que essas motos terão problemas de esfrega-esfrega, roça-roça e superaquecimento de componentes.

Em poucos meses, no máximo dois anos, um recall irá estourar no colo dos proprietários. Na verdade, o que vai estourar fica um pouco mais pra baixo.

Não é zica nem praga nem vidência, é somar 2+2.

Opa, mas parece que nem vou precisar esperar tudo isso não.

Até eu me espanto com a previsibilidade da coisa...

Depois da postagem pronta, encontrei um fórum discutindo os problemas que já estão acontecendo com o novo motor Milwaulkee 8:
Fórum: http://www.hdforums.com/forum/milwaukee-eight-m8/1134021-m8-problems-5.html

Já tem proprietários falando até em motores trocados em garantia e problemas com a bomba e perda de pressão do óleo.

Olha só que coisa...

Tem gente falando que a fábrica está fazendo um "recall branco" (reparo durante as revisões que eles não divulgam nem convocam os proprietários porque supostamente não há risco à segurança) — não divulgam porque pega muito, muito mal:
Fórum: http://www.hdforums.com/forum/engine-mechanical-topics/1134285-milwaukee-8-problems-6.html

O motivo é esse que você leu, cavacos nas galerias de óleo causando perda de pressão, deficiência de lubrificação e superaquecimento.

Motor dando problema com 120 milhas rodadas, menos de 400 200 km. Bah, estou ruim de conta.

Onde foi que vi isso acontecendo?

Ah, lembrei.

Não foi o caso da Kansas não — a Kansas não tinha cavaco, era só falta de óleo mesmo. 

Foi no caso bizarro da postagem de amanhã... 

Como eu havia dito, era natural esperar que esses problemas fossem acontecer.

Quando você força para o infinito e além as coisas que já estão no limite do viável, está jogando fora margens de segurança — alguma coisa será sacrificada.


Há limites que o bom senso manda não ultrapassar.


Mas enfim... eles sabem o que fazem, né?

O tempo dirá se estou certo ou não quanto aos recalls que virão.


Quem quer apostar comigo?

Esse problema de forçar o limite da viabilidade técnica ao menor custo no menor prazo não é só da harley ou indian ou polaris — exemplos não faltam.

Mas como sempre, a postagem ficou mais longa do que o planejado.

Então vou desmembrar o texto em duas (ou três ou quatro) etapas, senão todo mundo vai desistir de ler.

E assim também aumento o suspense.

Um abraço, e até amanhã com um dos casos mais escabrosos da história automotiva,

Jeff

8 comentários:

  1. Muito bom o post Jeff! O mais assustador dessa história, é que o problema foi criado simplesmente por causa de algo INÚTIL. Tradicionalismo babaca de donos de harley que se acham mais ''motociclistas'' que outros. Pois bem, está ai o que ganharam, motores explodindo. Pior é que isso afetou pessoas que chegaram ao universo da Harley porque acharam as motos bonitas e ganharam essa bomba de brinde. Isso me fez pensar, o que nós, Brasileiros faremos com esse problema? Porque não é todo lugar que tem gente que saber mexer em HD.

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    1. Obrigado, Danilo!
      O assustador nesses processos que a gente vê acontecendo em projetos modernos é que as coisas ficam cada vez mais difíceis de solucionar.
      Não existe como reformar um motor ou uma moto inteira nos recalls e revisões de concessionária. Um projeto que nasce com problemas graves pode condenar o destino de uma empresa.
      A próxima postagem fala de um problema grave que afundou a divisão Pontiac da GM. Era uma empresa centenária com autonomia dentro do conglomerado da general motores e não sobreviveu a projetos mal engendrados.
      Vale lembrar que o motor Milwaulkee 8 já veio para suceder a família Twin Cam que teve muitas reclamações.
      Neste artigo aqui o autor comenta que o melhor motor da harley é o Evolution que equipa as Sprtster 1200.
      http://www.jamesrussellpublishing.biz/beforeyoubuyharley.html
      Isso confirma o minha suspeita, quanto mais se tenta extrair do pacote, menos confiável ele é.
      Se essa perspectiva de problemas no novo motor se concretizar, e os ventos estão soprando contra, a HD e os seus proprietários terão um enorme abacaxi pela frente. Pelo bem dos proprietários, tomara que não.
      Um abraço,
      Jeff

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  2. Os antigos motores da Hd eram robustos, confiáveis e de facil manutenção igual aos fuscas. Porém com as normas restritivas ambientais tentaram moderniza-los e o resultado é esse ai. O melhor motor hd depois do evolution é o da parceria com a porshe. Não falem mal da hd ou os ilustres defensores de meia idade que compram esses motos se sentiram ofendidos... O melhor a fazer é treinar os mecanicos brasileiros no curso oficial promovido pela marca pagando o curso com o dinheiro da venda do seu rim e jamais se esquecendo de comprar as ferramentas e o scanner milhionario hd para mexer nessas motos.

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    1. Olá, Walter!
      Coincidentemente, esses dois modelos da hd são justamente os que eu mais simpatizo, as Sportster por causa da cilindrada mais próxima do razoável e a V-Rod por causa do motor e visual modernos. Na linha deles, fora essas só aquela do Exterminador pelo visual.
      Mas a partir do momento em que uma moto não me permita trocar uma vela no meio da estrada, ela não serve mais para mim. Com grana para comprar uma dessas, eu iria comprar uma suzy Savage 650 lá no Chile. Tem uma cilindrada civilizada e acesso fácil ao motor.
      Um abraço,
      Jeff

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  3. E aí, Jeff?!
    O que você pensa sobre o castor oil (óleo de mamona)? Não sei se você já publicou sobre ele no blog, dei uma pesquisa rápida e não encontrei nada, por isso estou perguntando. Abraço!

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    1. Olá, McGyver!
      Óleo de mamona em motor 4 tempos não dá certo não... era usado em motores 2 tempos para ser queimado junto com a gasolina. Motores 2T não usam cárter de óleo, a única lubrificação de todos os componentes é feita por esse óleo porque a gasolina circula por todo o motor, inclusive o "cárter" — a mistura de gasolina passa por lá com o óleo de mamona antes de ser admitida pelas janelas (e não válvulas) na câmara de admissão.
      Esse óleo não resiste às altas temperaturas pelo tempo suficiente, no cárter 4T viraria borra instantaneamente. E misturado na gasolina só serviria para fazer fumaça e carbonização.
      Devido às válvulas e suas sedes, a circulação da mistura e gases de escapamento nos motores 4T não é tão intensa e desimpedida como nos motores 2 T que usam grandes janelas de admissão e escape.
      Essa seria a primeira invenção do McGyver que não daria certo...
      Um abraço,
      Jeff

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  4. Nunca fui cm a cara das HDs nem de quem pilota, parece outro mundo e depois dessa postagem só lamento quem adquiriu.

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    1. Não dá para generalizar, tem caras legais que nem o Bayer, meu amigo Igor, mas uma vez estávamos subindo a serra acho que de Ubatuba em um comboio de Kansas e passou pela gente um comboio de Harleys... Ninguém deles se dignou a olhar para o nosso lado. Engraçado que estavam todos lado a lado e não num comboio em ziguezague, como pede a segurança. Todo mundo duro no guidão mantendo distância com precisão milimétrica e fazendo cara de mau, parecia desfile militar.
      Cadê a liberdade individual que só a moto te dá quando todo mundo se sente obrigado a representar um papel somente porque é fanzão de uma marca?
      Estou fora disso.
      Um abraço,
      Jeff

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