Ontem eu não expliquei como recuperei o acesso ao blog... foi macumbaria tecnológica do meu amigo Vinícius que eu demorei a conseguir colocar em prática. É bom ter amigos que mexem com computador. ("Mexer com computador" é a frase que mais irrita um profissional de TI. Mas se não sacanearmos os amigos, qual a graça? Muito obrigado mais uma vez, Vinícius!)
Bom, a história de hoje começou na BR-116.
Bom, a história de hoje começou na BR-116.
Sabe aquela via onde até motos pagam pedágio para a concessionária garantir a qualidade do asfalto? Tá bom.
Não fazia muito tempo que tínhamos saído do Graal Japonês e, antes de chegarmos a Santa Rita do Ribeira, passamos por um buraco no asfalto pedagiado que era tão grande, mas tão grande... que o pneu traseiro bateu contra o para-lama.
O para-lama deplástico de alta qualidade prástico vagaba da Jezebel quebrou e a placa ficou pendurada pelo lacre, batendo na roda — e a capa do escape rompeu a braçadeira e ficou arrastando no chão.
O para-lama de
Se foi ruim pra ela, imagine para a pobre coluna vertebral do esqueleto bem fornido que vos tecla.
Improvisei um reparo com elástico fru-fru e laça-gato (nunca saia de casa sem eles), e no primeiro posto fiz um bom reparo com arame. Na moto, não na coluna.
Almocei em Juquiá e desviamos para a SP-165.
Ao chegarmos a Sete Barras, onde por um trecho ela se chama SP-139, caí na besteira de pedir informação no posto ipipiranga. É, aquele mesmo.
Imagem: google maps errados.
A seta laranja é a Jezebel e o ponto preto é o meu capacete.
E eu sou aquela forma aerodinâmica azul entre o capacete e a Jezebel.
E eu sou aquela forma aerodinâmica azul entre o capacete e a Jezebel.
No posto disseram que iríamos encontrar a estrada para Eldorado no ashjsoubiu nhanfaru a ponte.
“Onde????”
“Ashjsoubiu nhanfaru a ponte.”
É, eu devia ter tirado o capacete para ouvir melhor.
Agradeci e segui em frente, pelos gestos eu entendi que precisava virar à direita em algum lugar perto da ponte.
Agradeci e segui em frente, pelos gestos eu entendi que precisava virar à direita em algum lugar perto da ponte.
Se ele mencionou a ponte, então devia ser depois da ponte... não faria sentido falar em algo antes da ponte.
Mas um pouco antes da ponte, apareceu uma placa apontando Eldorado por uma estrada de terra feinha que só ela... não podia ser isso.
Então passei pela ponte, avancei um bom trecho, mas nada de estrada lateral, então devia ser mesmo aquela estradica com a placa logo antes da ponte.
Como não uso celular, fiz um esforço mental e relembrei o mapa do google, eu havia estudado o percurso por vários dias, a estrada asfaltada era mesmo antes da ponte.
O trecho inicial foi ficando cada vez menos inicial e cada vez mais feioso, chegou um ponto em que achei que não valia mais a pena voltar, o fim do suplício devia estar próximo. Não estava, ainda tinha uns 20 km até a primeira cidade.
Até hoje o mapa do google mostra asfalto (estrada preferencial amarela) onde é terra, e terra (estrada secundária branca) onde na verdade é asfalto — confira no google street view. Eternally grateful, google...
Até hoje o mapa do google mostra asfalto (estrada preferencial amarela) onde é terra, e terra (estrada secundária branca) onde na verdade é asfalto — confira no google street view. Eternally grateful, google...
Foram 35 km da pior estrada de terra que você imaginar, com vários trechos de subidas e descidas aterradas com pedriscos em que a moto ia para onde bem entendia — Jezebel queria mesmo era fugir dali.
Sem contar que quase perdi a vida nos vários mata-burros...
Imagem: Mata-burro pra quem não conhece. Mata-burros matam burros e motociclistas.
As costelas de vaca (não de boi) eram tão ruins que comecei a ter medo das conexões elétricas se soltarem, os parafusos afrouxarem, as porcas voarem, a moto começar a se desmanchar no meio da estrada, e nós rodeados por bananas.
Bananas longas frutas amarelas, porque não havia uma alma por perto, nem ao menos um posto ipipiranga. Bananas.
Ao chegarmos a Eldorado, minha coluna estava abrindo o bico de papagaio — tive de recorrer a um analgésico forte para seguir viagem.
Pior burrada, como se verá.
Pior burrada, como se verá.
Pilotar uma moto sob efeito de medicação para dor pode ser fatal, algo que eu já sabia, mas não tinha escolha — além de rever os amigos, o outro objetivo da viagem era receber um pagamento que não pôde ser feito por depósito bancário... ou eu chegava a Floripa, ou não teria como voltar para casa.
Bom, até poderia voltar, mas nos dias seguintes não teria o que comer, o que seria um problemão.
Na farmácia o assunto foi a precariedade da estrada, mas o pessoal estava animado, isso ia mudar.
O deputado nascido por lá e que nunca fez nada pelas estradas da região agora tinha sido eleito para um cargo importante lá em Brasília — acho que presidente, sei lá, faz tempo que eu desisti de acompanhar a política.
O homem passou o fim de semana na terra natal e prometeu fundos e mundos.
Disse que ele faria a coisa mudar — e os coitados que acreditaram na promessa estão esperando alguma ação do governo federal até hoje.
O homem passou o fim de semana na terra natal e prometeu fundos e mundos.
Disse que ele faria a coisa mudar — e os coitados que acreditaram na promessa estão esperando alguma ação do governo federal até hoje.
Só no final do ano passado disseram que ia sair uma merreca do governo paulista, menos de 200 milhões para toda a enorme região do Vale do Ribeira.
Só vai dar para pagar as placas anunciando as obras, que por lá são grandes. As placas. As obras são só tapa-buraco. Buracos mal tapados, ainda por cima.
No caminho para o Parque do Ribeira fui contemplado com outro buraco, um buraco camuflado no meio de outros buracos que me fez sentir saudades do primeiro buraco lá da BR — até parei para ver se o buraco tinha danificado a roda, foi difícil sentar na moto de novo. Hummm... ficou esquisito.
Cheguei à pequena Iporanga, 4.333 habitantes, e a moto não deu partida depois da parada obrigatória da tubaína da tarde.
A conexão de carga da bateria realmente tinha se soltado com a vibração e a bateria tinha morrido, felizmente foi um problema fácil de achar e resolver, só apertar de novo o conector e fazer a moto pegar no tranco.
Precisei apertar bem apertado para não arriscar ficar sem farol nem partida no meio da serra, não seria uma boa tentar dar partida no tranco num lugar cheio de onças no caminho para Apiaí. Se bem que a motivação seria forte.
A conexão de carga da bateria realmente tinha se soltado com a vibração e a bateria tinha morrido, felizmente foi um problema fácil de achar e resolver, só apertar de novo o conector e fazer a moto pegar no tranco.
Precisei apertar bem apertado para não arriscar ficar sem farol nem partida no meio da serra, não seria uma boa tentar dar partida no tranco num lugar cheio de onças no caminho para Apiaí. Se bem que a motivação seria forte.
Reportagem: http://www.registrodiario.com/noticia/6546/video-onca-pintada-e-flagrada-em-rodovia-no-vale-do-ribeira.html
Fiz o conserto morrendo de cansaço e dores, então tomei mais comprimidos e ganhei o conselho do frentista do posto (a parada obrigatória da gasolina da tarde):
“Vai atravessar o parque? A estrada é muito ruim, se eu fosse você eu não passava lá de moto. Nem de carro.”
“Pior do que a estrada até aqui?”
“Muito pior. Põe pior nisso. Nem ambulância passa por lá.”
Devia ter aceitado o conselho, ele não estava exagerando.
Com a buraqueira, minha coluna só piorava e o que eu mais queria era chegar até Apiaí para pernoitar e torcer para as dores sumirem durante a noite.
Pilotar uma moto sob efeito de remédios e com o foco fora da pilotagem — eu só pensava nas dores e na urgência em cair na cama — é um dos maiores erros que podemos cometer.
Um erro que pode ser fatal, aprenda comigo.
Pilotar uma moto sob efeito de remédios e com o foco fora da pilotagem — eu só pensava nas dores e na urgência em cair na cama — é um dos maiores erros que podemos cometer.
Um erro que pode ser fatal, aprenda comigo.
O percurso através da mata cerrada do Parque Estadual foi ainda mais demorado e sofrido, até que chegamos a um trecho em que a estrada melhorou um tiquinhozinho de nada.
A serra quase escurecendo, eu querendo chegar em Apiaí antes do fim da luz, pensamentos chegando lá antes da moto, por puro desespero comecei a aumentar a velocidade um pouco mais na medida em que a terra melhorava.
Minha percepção prejudicada pelos remédios dizia que eu não estava correndo, talvez uns 40 km/hora (mas talvez fosse um pouco mais) — foi o suficiente.
Minha percepção prejudicada pelos remédios dizia que eu não estava correndo, talvez uns 40 km/hora (mas talvez fosse um pouco mais) — foi o suficiente.
No meio da estrada tinha umas pedrinhas...
Pedrinhas bestas, nada comparável nem de longe ao que já tínhamos passado para chegar até ali — antes de tomar a medicação.
A estrada não tinha acostamento, muito menos guard-rail, e as pedrinhas ficavam do lado de um precipício na serra...
De repente, não mais que de repente, a roda dianteira desgarrou e fomos pro chão como duas jacas pachorrentas.
E na próxima postagem eu conto o desenrolar do drama. E o rolar das jacas.
Spoiler: Sobrevivemos quase inteiros e temos fotos pra mostrar.
Um abraço,
Jeff
Uau! Meu deus Jeff, essa aventura está incrível. Me lembra uma viagem que fiz ao norte de minas.
ResponderExcluirOlá, Ravine!
ExcluirEntão, de moto a gente sempre sai ganhando: as piores aventuras acabam sendo nossas melhores histórias...
Um abraço,
Jeff
Saúde & Paz!
ResponderExcluirAmigo, seguia seu blog religiosamente. De repende....pararam as postagens.
Hoje...digitei aqui e surgiram postagens novas.
Que houve???
Abraços e Sucesso.
pereija@hotmail.com
OLá, Pereija
ExcluirObrigado! Eu conto a história na postagem http://minhaprimeiramoto.blogspot.com/2020/02/nao-jezebel-e-eu-nao-morremos.html
Forte abraço,
Jeff