Apenas separei alguns casos, para quem quiser pesquisar o assunto vai longe...
Mas para concluir e encerrar o assunto destas duas semanas, vamos voltar à vaca fria:
Vendo tantos recalls por motivos graves e bizarros acontecendo, é o caso de perguntar:
Por que tantos problemas acontecem e são descobertos somente depois que as motos (e carros e mais um monte de produtos) estão nas mãos dos clientes — colocando a vida e o patrimônio deles em perigo?
A principal responsabilidade dos fabricantes é fornecer produtos confiáveis e seguros — não podemos abrir mão disso.
Mas parece que hoje a preocupação das fabricantes com o custo de fabricação, o preço de venda, a beleza, a propaganda, o apelo aos consumidores e a rapidez no lançamento e na obsolescência de novos produtos se sobrepõe a qualquer critério de segurança.
Imagem: http://leninja.com.br/obsolescencia-programada/ — A comparação entre windows e apple é bizarra... a microsoft não se diferencia da concorrência na hora de obrigar os consumidores a migrar para novos sistemas operacionais...
Mais sobre obsolescência programada: http://na-beirada.blogspot.com.br/2012/04/obsolescencia-programada.html
— O produto novo tem um risco mortal...
Nôu problem, se custar menos de 10 centavos a gente conserta na revisão e não fala nada — e cobra como "materiais diversos".
— Mas vai custar mais de 10 centavos...
Bom, o jeito é marcar uma reunião para discutir o assunto.
— O produto já matou alguém...
Tudo bem, o departamento jurídico cuida disso para negar a responsabilidade. Na pior das hipóteses, eles negociam a menor indenização possível.
— A imprensa está fazendo alarde...
A gente aumenta a verba publicitária para preservar a imagem da empresa e manter as vendas lá no alto e enrola o quanto puder.
— As autoridades estão investigando...
É, não vai ter jeito, faz um recall.
É triste, mas é assim que eu imagino essas decisões vitais sendo tomadas nessas empresas...
Imagem: Montagem sobre https://cityroom.blogs.nytimes.com/2010/10/18/complaint-box-recap-meetings-and-those-who-hate-them/?_r=0
Eu acuso as montadoras de descaso com seus clientes devido à urgência desmedida de lançar novos produtos no mercado sem fazer os devidos testes de confiabilidade e durabilidade.
Antigamente novos produtos eram testados no mínimo por dois anos antes de irem paras as ruas.
Hoje o projetista dá ENTER no computador e as motos já começam a ser despachadas para as concessionárias.
Estou exagerando, mas não é muito diferente disso.
A data de lançamento é definida antes de outros parâmetros fundamentais do projeto — e os funcionários que façam mágica para cumprir as metas.
Imagem: Montagem sobre arte original de https://pursuingawesomeness.wordpress.com/2015/04/01/the-rider-the-donkey-a-metaphor-for-levelling-up-through-the-intermediate-stage/
Se vai dar certo ou não, aí é outra história...
Chega uma hora em que se ultrapassa o limite do razoável e os problemas superam as vantagens.
Veja o caso da harley e da indian:
Os motores de menor cilindrada das Sportster e das Scout não excederam a barreira do viável e não dão problemas... enquanto os maiores estão decepcionando ou a caminho de decepcionar seus proprietários.
Fique esperto, porque se depender dos fabricantes, sejam quem for, você estará cada vez mais entregue à própria sorte porque as metas são cada vez mais inalcançáveis.
Como a dafra demonstra com as Indian e Kansas, nem mesmo na hora de convocar um recall que poderá salvar vidas eles enfiam a mão no bolso.
Mas para fazer propaganda na hora de vender, a estória é outra, vale até computação gráfica:
A dafra nunca se retratou por recomendar menos óleo que o mínimo necessário para as Kansas e Speed, e repetiu o escárnio com as Horizon 150.
A dafra não teve pudor de omitir e alterar informações em seus próprios manuais de proprietário, "porque assim se ganha mais dinheiro", já dizia o Cazuza.
A honda demorou uma eternidade para descobrir a causa do problema de incêndio do freio das Gold Wing, mas pelo menos teve a decência de convocar publicamente o recall até mesmo no Brasil... Antes tarde do que nunca.
Em compensação, até hoje a honda "não descobriu" o motivo dos motores começarem a pipocar depois da adoção do óleo 10W-30.
E até hoje deita e rola em cima dos proprietários que estão perdendo seus motores por confiar na empresa e usar esse óleo inadequado que até outro dia não era recomendado para o Brasil.
Suas concessionárias cometem o desplante de recomendar o famigerado óleo 10W-30 até mesmo para motos que originalmente usavam 20W-50, como a CB 300...
O resultado é o que todos conhecem.
Graças a essa pressa de lançar novos produtos e ganhar mais dinheiro, os fabricantes não cumprem com sua obrigação de colocar à venda produtos seguros.
Quando descobrem um problema grave, nem sempre dão o destaque que a situação exige.
Se omitem quanto a seus deveres máximos — alguns são omissos até mesmo diante do que a lei determina.
O Casoy diria que tais erros e atitudes são uma vergonha.
Outros diriam que é a falta dela.
O pessoal sai de fininho e finge que nem é com eles.
Os engenheiros da polaris / indian, cujos problemas desencadearam esta série de postagens, não são vilões.
Eles certamente se empenharam em fazer o melhor projeto possível, e os quadriciclos e as motos fabricadas por eles são prova disso.
A gente vê nos detalhes que há paixão no desenvolvimento de todos os componentes das máquinas.
O lamentável é que na hora de unirem essas peças eles cometeram falhas de projeto elementares, indignas até de iniciantes — e essas falhas custaram vidas.
E assim como eles, a imensa maioria dos engenheiros das outras empresas também não quer ser vilão.
Mas eles são obrigados a trabalhar para atingir objetivos fora da realidade estabelecidos por critérios de marketing e não de bom senso.
Em nome do mercado, perdeu-se o pé da realidade, e isso está colocando vidas e patrimônios em perigo.
Está faltando alguém lá dentro dessas empresas dar um murro na mesa e afirmar em alto e bom som:
Imagem: http://www.arthur.bio.br/2013/12/31/relacionamentos/basta-ou-a-gota-que-faltava#.WJBfglMrK1s
Não dá para lançar produtos confiáveis nos prazos exigidos e nos custos de produção almejados!
Ou talvez alguém já tenha dito isso e foi substituído por outro engenheiro mais "pró-ativo e alinhado com as metas da empresa"... nunca saberemos.
Algo está profundamente errado na maneira como as empresas estão lançando produtos no mercado.
Quando a gente vê empresas como a harley-davidson lançando no mercado uma moto que precisa passar por recall porque não cumpre normas elementares — como a obrigatoriedade de instalar refletores na traseira da moto...
Imagem e reportagem: http://www.asphaltandrubber.com/recall/harley-davidson-recalls-motorcycles-lack-reflectors/
Ou uma honda da vida soltando no mercado milhões de motos perigosas porque os piscas não atendem às normas internacionais de distância mínima em relação ao farol...
E ainda por cima, retirando o modelo de fabricação de fininho, sem nunca convocar um recall...
Denúncia: http://minhaprimeiramoto.blogspot.com.br/2014/09/uma-modinha-e-milhoes-de-motos.html
Mesmo sabendo que os piscas embutidos no farol descumpriam a legislação e
E ainda fez o marketing dos novos piscas externos da CG 2014 afirmando cinicamente que eles são "atualizados e atendem às normas internacionais de iluminação com excelente sinalização" — tudo o que os piscas das CG 2009 a 2013 não faziam e não fazem até hoje!
É ou não é o cúmulo do máximo da cara de pau?
Ver tantas empresas que se dizem sérias cometendo tantos erros que colocam as vidas dos usuários em perigo é suficiente para perder de vez a fé nas indústrias automotiva e de motocicletas.
Eu responsabilizo a ganância das empresas por levar ao abandono das práticas consagradas de Engenharia.
Culpo essa pressão absurda para vender cada vez mais e mais rápido, sem enxergar direito o que estão fazendo, sem prever as consequências dessa pressa irresponsável.
Na ânsia de despejar novos produtos no mercado, transformaram os consumidores em pilotos de prova e cobaias de teste.
Se alguma coisa der errado, fazem um recall.
Ou tiram o produto do mercado fazendo de conta que o problema nunca existiu — até têm o descaramento de usar a falha do projeto anterior como argumento de vendas para o novo produto.
Ou então enrolam o quanto podem para não assumir a responsabilidade pelos erros.
Quando não jogam a culpa pelos problemas nas costas dos clientes que nem sabem onde encontrar os argumentos mínimos para contestar esse abuso de poder.
Enquanto as verbas para o marketing forem a maior prioridade, e a segurança e confiabilidade dos produtos for sacrificada, continuaremos a ver os nomes de grandes empresas associados a escândalos revoltantes.
Revoltantes porque evitáveis.
Essa fórmula aplicada pelas empresas de "máxima qualidade no menor prazo e menor custo" está errada.
Imagem: http://uncyclopedia.wikia.com/wiki/Unobtainium
Começa errada porque nem considera a segurança final do produto.
Além disso, essa equação não fecha.
É algo impossível de se obter.
Para atingir duas dessas metas, você é obrigado a abrir mão de uma.
E ao priorizar o menor prazo de desenvolvimento dos produtos e o menor custo de fabricação, automaticamente a qualidade e a segurança do produto vão pelo ralo.
Alguém precisa dar um basta nessa espiral decadente de obsolescência programada e muitas vezes imprevista que os carros, motocicletas e demais produtos estão cumprindo cada vez mais rápido.
Se você souber de algum outro motivo para isso estar acontecendo além da ganância e abandono das práticas consagradas de Engenharia em prol do marketing e aumento das vendas, é só dizer nos comentários.
Obrigado por acompanhar o meu desabafo, eu precisava dizer essas coisas.
Estavam entaladas na garganta há tempos...
Um abraço,
Jeff