terça-feira, 7 de novembro de 2017

Os erros absurdos da literatura técnica da Chopper Road (e também alguns pontos positivos sobre a moto)

Prosseguindo com a série de postagens sobre a nova haojue Chopper Road 150, vou falar das coisas francamente erradas publicadas pela haojue em seu manual do proprietário e também no catálogo de peças.

Alguns desses tropeços são graves e podem colocar os ocupantes da moto em risco como a recomendação de colocar 800 ml de óleo em um motor com capacidade para 1.200 ml abordada na postagem anterior, e outros que serão apontados nas próximas postagens.

Se a haojue pretende ganhar mercado em relação à dafra Horizon 150, sua única concorrente 'custom' no mercado, não pode cometer a mesma pegadinha de indicar menos óleo do que o mínimo necessário.

Um ponto positivo é que tanto o manual do proprietário quanto o catálogo de peças estão facilmente acessíveis em links no site da haojue, uma atitude elogiável da empresa.
Imagem: Site da haojue Chopper Road 150 no link site https://haojuemotos.com.br/models/chopper-road-150/ 

Geralmente o pessoal dificulta encontrar o link para o manual e disponibiliza os catálogos de peças somente para os concessionários.

Vou começar com os tropeços do catálogo de peças, que são novidade, para depois comentar o manual do proprietário...

Se prepare que aí vêm coisas muito, muito bizarras...

Antes de tudo, um ponto positivo: a disponibilização do catálogo de peças...

Para quem não conhece, o catálogo de peças é a informação passada pelas fabricantes aos concessionários para facilitar a identificação dos componentes da moto na hora de vender peças de reposição.
Imagem: Catálogo de peças com link no site https://haojuemotos.com.br/models/chopper-road-150/

Esse catálogo é muito útil para o vendedor localizar para você as peças necessárias para um reparo.

Ele também permite saber coisas interessantes, por exemplo:

Apesar de o conjunto carburador ser mostrado com diversos componentes, nenhum deles pode ser comprado avulso.

Não existe o chamado kit de reparo do carburador. Irão lançar no futuro?

Não há nenhum giclê, nenhum anel de vedação, mola, agulha, boia, válvula, junta, nada para venda avulsa — apenas componentes universais ou que nunca se gastam.

Ao longo dos anos o carburador terá algum desgaste normal de componentes como giclês, válvulas ou boia, e você terá de trocar o conjunto inteiro — a menos que encontre peças compatíveis no mercado. 

Isso pode até ser preferível dependendo da capacitação técnica de quem estiver mexendo na sua moto, mas se você quiser economizar comprando as peças avulsas, terá de procurar fora da concessionária — ou então pagar a fatura do carburador completo. 

Por outro lado, um carburador trocado a cada 5 anos também não é o fim do mundo. Jezebel já está no seu segundo carburador, e também no segundo cilindro mestre do freio dianteiro. Em breve estará com o terceiro cilindro mestre, mas isso é assunto para outra postagem.

Tropeço nº 1: a tradução do catálogo de peças...

O catálogo de peças é um documento da mais alta responsabilidade, mas infelizmente não recebeu o respeito merecido.

O desconhecimento abismal de quem "traduziu" a literatura técnica dessa moto é assustador...

Não é um problema apenas de tradução. 

Se fosse, seria até compreensível, dada a dificuldade de traduzir os nomes das peças do Chinês para o Português usando o tradutor do google.

Quem fez o material não tem a menor ideia de como funciona um motor de moto, nem conhece o nome e a função de cada componente.

E o material não foi revisado por alguém com conhecimento técnico, o que deixa esse catálogo bem abaixo dos padrões mínimos da indústria.

Compare a vista dos componentes "pescador de óleo, mola da bomba de óleo e tampa da bomba de óleo" da figura 3 (no destaque vermelho) com a vista do conjunto da "pomba de óleo" (sic) da figura 14: (fiz uma montagem destacando os dois para facilitar.)
Imagem: Catálogo de peças com link no site https://haojuemotos.com.br/models/chopper-road-150/

Essas peças atribuídas à pomba bomba de óleo não têm relação alguma com ela... 

Os itens 14 a 17 constituem o filtro de tela do óleo do motor, aquele que você mesmo abre e limpa a cada troca de óleo.

O "pescador de óleo" é a tela — basicamente, o próprio filtro. 

A "mola da bomba" é a mola do filtro. A "tampa da bomba" é a tampa do filtro de tela do óleo.

Não tem bomba nessa parada...

Imagens: Vista lateral externa esquerda e vista lateral interna direita de motores com componentes similares. 
http://minhaprimeiramoto.blogspot.com.br/2017/02/o-dia-em-que-honda-deu-um-tiro-no-pe.html e http://minhaprimeiramoto.blogspot.com.br/2017/10/o-que-tem-dentro-do-motor-da-sua-moto.html

O filtro de tela do óleo instalado externamente na tampa esquerda do motor não faz parte do conjunto da "pomba de óleo" instalada na carcaça direita do motor, debaixo da tampa da embreagem... Aliás, um verdadeiro crime ecológico colocar a pobrezinha espremida ali dentro. Coitadinho do bichinho

O filtro de tela do óleo é um dos componentes mais básicos do motor — um item de inspeção frequente em todas as revisões.

Todo ajudante de aprendiz de faxineiro de oficina de motos, por mais fuleira e boca de porco que seja, conhece esse filtro... mas não os responsáveis pela literatura técnica da Chopper Road. Decepcionante. Fizeram uma economia que não valeu a pena.

Além disso, o catálogo de peças causará dificuldades na hora de comprar peças de reposição.
Imagem: Catálogo de peças com link no site https://haojuemotos.com.br/models/chopper-road-150/

A arruela do filtro centrífugo 24 virou "arruela da bomba de óleo"...

Alguém é capaz de explicar a existência de um suposto "pino da bomba de óleo" dentro do filtro centrífugo?

Bomba e filtro centrífugo são subconjuntos 'fechados' separados, e a única ligação mecânica entre eles não é feita por um pino dentro do filtro — mas por engrenagens externas aos componentes, como informado em azul na foto à direita acima.

E a bomba de óleo nem sequer tem um pino... isso está totalmente fora de lugar, erro de tradução puro e simples, mas que pode causar muita confusão.

Com um catálogo tão problemático, os vendedores terão muita dificuldade para localizar componentes na hora da venda... 

Os responsáveis por cometer essa tradução do catálogo de peças não conhecem as peças nem o funcionamento do motor, e não têm noções básicas de desenho técnico.

A Chopper Road é a única moto do mundo que não tem uma embreagem de partida... 

Pelo menos não com esse nome, porque ela é o subconjunto nº 9 identificado como "engrenagem de partida" na figura 5:
Imagem: Catálogo de peças com link no site https://haojuemotos.com.br/models/chopper-road-150/

A embreagem de partida não é uma embreagem de atrito, como aquela que você usa para controlar o motor, mas basicamente um tipo de catraca.

Ela gira em uma única direção e serve para isolar o giro mais rápido do virabrequim em relação ao pinhão de partida quando o motor começa a funcionar.

O subconjunto da embreagem de partida possui 8 tipos de peças totalizando 11 componentes mostrados na figura, mas é identificado como apenas mais uma das muitas "engrenagens de partida" desse catálogo... 

No motor há somente três engrenagens de partida — motriz, movida e intermediária — que aparecem mais abaixo na figura 6.

Essa embreagem/catraca é um conjunto totalmente diferente de uma engrenagem de partida, compare:
Imagem: https://motos.mercadolivre.com.br/acessorios-pecas/engrenagem-da-partida-xr-200 - Esta embreagem de partida tem construção um pouco diferente, mas no geral todas têm esse conjunto de 3 ou 4 roletes com molas — coisa que uma engrenagem decididamente não tem.

Não dá para confundir uma com a outra.

A única vez em que a expressão "embreagem de partida" é mencionada em todo o catálogo é na seção "Encrenagem de partida" (sic).
Imagem: Catálogo de peças com link no site https://haojuemotos.com.br/models/chopper-road-150/

Outra peça que será difícil de encontrar é o "rotor da engranagem" (sic) que na verdade é a carcaça do filtro centrífugo de óleo, o filtro de óleo principal do motor. 

A peça mostrada é a carcaça, não sua engrenagem de acionamento (que foi apontada como engrenagem de partida, item 8).

E essa engrenagem, apesar de aparecer ao lado da outra no desenho, não se engrena com a tal "engrenagem de partida" que na verdade é a embreagem de partida. Bizarro. Caótico.

Outra coisa:

Aquele conjunto de peças alinhadas desde o item 8 até o item 23 na figura lá de cima compõem o filtro centrífugo de óleo, não a bomba de óleo.

E ele é montado e instalado conforme a linha destacada em azul, do outro lado do motor em relação ao filtro de tela de óleo — aquele que foi chamado incorretamente de tampa, mola e pescador de óleo...

Um catálogo de peças com uma salada de erros tão graves dará muita confusão na hora de vender peças no balcão... Se eles não corrigirem isso, prepare-se para passar raiva na hora em que precisar de peças.

Aliás, deveriam ter corrigido antes de publicar, ninguém merece ler aquilo.

Tropeço nº 2: o descuido com a qualidade do manual do proprietário...

Tem coisas nesse manual que fazem parecer que quem fez a tradução só vê motocicleta quando o motoboy chega com as pizza e as coca. Eu sei. É piada de paulista. Posso brincar com erros de concordância aqui no blog, mas nunca em um documento que é a comunicação direta da empresa com os clientes.

O manual do proprietário da haojue Chopper Road é um verdadeiro festival de atentados ao nosso idioma mesmo nas concordâncias mais básicas...

Um descuido tão grande quanto à apresentação visual, um desrespeito aos clientes e até mesmo uma afronta à lógica...
Imagem: Manual de proprietário da haojue Chopper Road 150 com link encontrado no site https://haojuemotos.com.br/models/chopper-road-150/

"Quando o interruptor do indicador de direção é pressionado para a esquerda, vire à esquerda."??? 

O certo não seria "Mova o botão do indicador de direção para a esquerda a fim de sinalizar uma conversão à esquerda."

"lâmpada quebrada"... Lâmpada boa é assim: quebra, mas não queima!

"Indicador reset"... 


Por que "indicador"? 

Por acaso a moto tem uma luzinha que acende na hora em que você gira o botão de reajuste do hodômetro parcial para zerar a contagem? 

Não, não tem — se tivesse, ela poderia ser chamada de indicador.

Por que "reset"?

Por acaso o hodômetro parcial é eletrônico? E se fosse o caso de ser eletrônico, não existe a tradução "reiniciar"? 

"Indicador reset" é simplesmente "botão de reajuste".

"Apertar a vela com as mãos?"

Eu queria ver alguém usar as duas mãos para apertar a vela de ignição naquele espaço onde mal cabem dois dedos.

Decifrando o texto:

"tampa da vela" = "conector da vela de ignição"

"É aconselhável substituir os anéis de vedação quando o óleo do filtro de motor é alterado."...

Como assim, "óleo do filtro de motor alterado"???

Essa "instrução" é uma das coisas mais toscas que já li... 

A Road Chopper não tem filtro substituível, e não fica óleo retido no filtro de tela.

Onde é que entra o "óleo do filtro de motor" nessa estória?

Tentaram dizer para substituir o anel e a arruela de vedação do filtro de tela do óleo e do bujão de drenagem do motor em todas as trocas de óleo?

Por que não disseram isso de maneira inteligível? 

Usaram google translator? Bem feito!

E esse carburador de "evaporação estável" deve ser alguma tecnologia nova que substituiu a 'pulverização' estável do combustível... o correto seria aspersão, já que tecnicamente o combustível não vira pó, mas isso é algo que já desisti de convencer os engenheiros... é uma luta inglória.

O que a haojue chama de "evaporador de combustível" no catálogo de peças é um componente do sistema de controle de emissões poluentes, não tem nada a ver com o funcionamento do carburador em si.

Incrível que essa literatura "técnica" grotesca tenha sido aprovada por engenheiros experientes no mercado como os da jtz – jta – j. toledo... ou não passou pela mão dos engenheiros?

Espero que revisem esses volumes da literatura técnica o mais cedo possível, e não, não estou interessado em pegar o trabalho.

Eu ficaria tentado a me divertir com o assunto...
Em todos esses anos trabalhando nessa indústria vital, eu pensava que já tinha visto de tudo nesse mercado...

Mas esse pessoal continua se superando a cada ano.

Sempre aparecem coisas novas que não deveriam.

Depois de descer a lenha, vou citar alguns pontos positivos:

Minhas críticas não são em relação à moto, que considero um dos pacotes mais interessantes já lançados, mas à atitude descuidada da empresa e ao uso de macetes condenáveis para abreviar a vida útil do motor e de componentes de desgaste caros — trazendo riscos aos ocupantes — coisas que sempre combato aqui no blog.

Nada contra a moto em si e sua mecânica, nenhum preconceito contra motos chinesas (tive duas e sempre me atenderam muito bem).

Vi a moto segunda-feira de manhã na concessionária e essa última versão com freios hidráulicos combinados está oferecendo um item que prezo muito: 

Segurança na frenagem. 

Freios eficientes salvam vidas, e mais eficiente do que freios a disco dianteiro e traseiro combinados, somente o caríssimo (e para mim, sempre passível de falhar na hora H) freio ABS.

O pacote da Road Chopper é mais bem equipado e tem acabamento superior à Kansas, e somente é comparável na categoria dela à Horizon 150 — que não tem freio traseiro a disco.

Considero o motor uma boa solução técnica pelos motivos que já comentei aqui:

O projeto une a boa característica do filtro de tela de óleo externo de fácil manutenção — cujas vantagens comentei em uma postagem anterior — somada à eficiência do filtro centrífugo interno mais o bom rendimento do comando no cabeçote.

São soluções técnicas que podem assegurar uma longa vida útil — desde que o motor não seja tratado com penúria de óleo lubrificante graças a estratagemas 'espertos' do manual do proprietário...

Os freios e o motor de manutenção fácil de ser feita pelo dono são dois fatores que a colocam em um patamar acima da agora clássica Intruder 125.

Além disso, a Chopper Road 150 está sendo vendida pelo preço de 6.290 realetas sem frete.

Esse é praticamente o mesmo valor cobrado no lançamento da dafra Kansas em 2008 — 6.500 reais — com o valor do dólar sendo quase a metade do que é hoje.

Naquela época eu dizia que nossas motos poderiam ser vendidas pela metade do preço que ainda dariam lucro para as empresas, e parece que essa moto confirma isso.

Se essa tendência de preços em queda continuar, finalmente teremos motos a preço justo neste país — desde que os empresários não fiquem tentados a recuperar a margem de lucro apressando a venda das peças de reposição.

A postagem ficou longa, vou parar por aqui e amanhã eu continuo descendo a lenha.

Vou falar das informações do manual do proprietário que podem colocar você, sua garupa, seu patrimônio e o motor de sua moto em sérios riscos.

Um abraço, menos aos responsáveis pelas pataquadas,

Jefferson

3 comentários:

  1. Esse é daqueles posts que tenho que ler com calma em casa, até comecei e já no inicio pintou a primeira dúvida. Carburador? São permitidos ainda nas motos atuais? Achei que com as tais normas de emissões só fosse possível atende-las com injeção eletrônica.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, Robson!
      Também fiquei sem entender esse lance... todo mundo falou que somente a injeção eletrônica permitiria atingir os níveis exigidos de poluentes, e aproveitaram para aumentar os preços da linha 2018 por conta disso...

      Aí chega essa moto com um carburador que é praticamente igual àquele que está na minha Kansas, única diferença é o respiro da cuba que agora recebe uma mangueira e vai para o cânister de carvão ativado.

      Ora, então não precisavam colocar injeção direta, era só colocar o barato cânister de carvão...

      Outra coisa que me surpreendeu foi ver que o freio combinado é uma simples válvula equalizadora de pressão, solução usadas pelos carros há mais de 60 anos, e melhora muito o desempenho da frenagem.

      Mas o ABS e a injeção eletrônica permitem a desculpa de aumentar o preço da moto e ainda por cima acendem luzinhas que ficam piscando no painel indicando problemas(?) que só a concessionária pode resolver...

      Minha intenção era fazer uma postagem curta, mas sabe como é, né?

      Um assunto puxa outro que puxa outro...

      Estas postagens sobre a Chopper Road podem gerar muita troca de ideias, se o pessoal tiver paciência e tempo para ler com calma...

      Um abraço, e obrigado por acompanhar o blog,
      Jeff

      Excluir
    2. A válvula equalizadora é uma solução muito barata.

      Lembro que discutimos isso no fórum há uns 7 anos e naquela época uma válvula dessas para Chevette era coisa de 30 reais.

      E olhei agora, até hoje você encontra por esse preço, e é para custar muito pouco mesmo porque é uma válvula muito simples, uma esfera, uma molinha e um corpo com conexões de mangueira. O conjunto no carro mede uns 5 cm, e na moto menos ainda.

      Mas tem uns espertos pedindo coisa de 600 reais na internet...

      Eu de novo,
      Fui

      Excluir