Notícia publicada no G1 semana passada:
O vídeo mostra o caminhão totalmente na contramão:
Vídeo e reportagem: https://g1.globo.com/sp/itapetininga-regiao/noticia/2020/02/26/motociclista-morre-apos-bater-de-frente-com-caminhao-em-rodovia-de-paranapanema.ghtml
O vídeo finaliza com a frase "As causas do acidente ainda serão investigadas".
Ao ver a cena você não se conforma e junto com todo mundo grita "caminhão na contramão, o motorista é culpado, lincha, lincha!" — e o perigo nessa hora é o pessoal se empolgar e cometer uma tremenda injustiça.
Será mesmo que o acidente aconteceu por causa do motorista do caminhão?
O que você nota ao ver a moto envolvida no acidente?
Imagem e reportagem: https://g1.globo.com/sp/itapetininga-regiao/noticia/2020/02/26/motociclista-morre-apos-bater-de-frente-com-caminhao-em-rodovia-de-paranapanema.ghtml
Frente totalmente destruída e roda traseira quebrada, certo?
Ora, a frente foi destruída no impacto com o caminhão, mas e a roda traseira?
A roda traseira não bateu contra o caminhão, nada ao redor dela bateu — o escapamento está inteiro, a rabeta está inteira.
Todo o lado posterior da moto está bem preservado, então me parece pouco provável que essa roda tenha se quebrado durante a batida. Pode até ser, mas...
Imagem e reportagem: https://g1.globo.com/sp/itapetininga-regiao/noticia/2020/02/26/motociclista-morre-apos-bater-de-frente-com-caminhao-em-rodovia-de-paranapanema.ghtml
A roda se quebrou no aro e também no raio, que mostra uma fratura do tipo frágil (instantânea e não por fadiga) em um local determinado — a roda não foi prensada entre a rabeta e o asfalto, senão ela estaria ovalizada.
Esse é um forte indício de uma pancada muito intensa e localizada — como o impacto contra a quina de um buraco profundo.
Buracos profundos costumam aparecer nas estradas em época de chuvas — estamos passando por uma temporada chuvosa sem precedentes e chovia no momento do acidente.
Buracos ficam cobertos de água suja e não permitem avaliar sua profundidade: o que parece uma poça inofensiva pode ser uma tremenda armadilha para motos.
Um cenário possível seria este (mas somente uma investigação do local e testemunhas poderão confirmar se esta suposição está correta):
Com a roda quebrada, o motociclista teria perdido o controle e a motocicleta começou a dançar na pista.
A moto teria desviado primeiro para a pista oposta, o motorista tentou desviar jogando o caminhão para a contramão, mas a moto sem controle inverteu a trajetória e aconteceu a colisão.
Invadir a contramão e retornar cruzando a pista, fazendo um S, é um comportamento típico de veículos desgovernados, como pode ser visto pelas marcas dos pneus de um carro que vinha na mão correta, perdeu o controle e capotou no acostamento:
Imagem e reportagem: https://planetafolha.com.br/11/01/2020/livramento-em-rolim-de-moura-familia-em-moto-escapa-da-morte-apos-carro-desgovernado-capotar-a-poucos-metros-de-distancia-na-ro-479/
Não se pode descartar que algo parecido tenha acontecido com a moto, por isso que as causas precisam ser investigadas.
Pessoalmente, sempre achei esse tipo de roda extremamente frágil para encarar nossas estradas esburacadas — até fiz uma postagem sobre isso em 2014.
É uma roda projetada para uso urbano, onde via de regra o asfalto é melhor conservado — pelo menos no Japão, onde a moto foi concebida — e as velocidades costumam ser mais baixas.
Naquela última viagem para Floripa em que o buraco na BR-116 quebrou o para-lama traseiro da Jezebel, a primeira coisa que fiz foi inspecionar as rodas — felizmente, a quina pegou na direção do raio e a roda aguentou o tranco.
Se tivesse batido na área entre os raios, o flange teria sido amassado, isso já aconteceu antes, mas uma vantagem da Kansas é usar câmara de ar, então o pneu não esvazia de repente.
Além disso, sua roda traseira é aro 16 polegadas (406 mm), então o espaçamento entre os centros dos raios é menor (255 mm).
Já o aro da suzuki Yes é de 18 polegadas (457 mm), por isso o espaçamento entre os centros dos raios é maior (287 mm).
Principalmente, a área da união entre raio e aro é menor na Yes, o que aumenta proporcionalmente o espaço vazio entre os raios — e quanto maior essa distância sem reforço, maior a fragilidade do aro:
Imagem: Roda traseira de Kansas (esquerda) e Yes (direita)
Na Yes, os raios são mais finos e vazados, e sua posição não ajuda a aceitar impactos — o raio da Kansas está na direção da compressão da pancada, enquanto o raio da Yes está na direção de dobramento, o que facilita sua quebra.
Pode ser um projeto bom para estradas do Japão e primeiro mundo, mas não é um projeto para as estradas do Brasil.
Em minha opinião, a roda traseira se quebrou ao passar por um buraco e causou a tragédia, mas sempre posso estar enganado. Todos nós sempre podemos estar enganados sobre tudo.
Então, tome consciência de que a primeira impressão de um acidente pode ser totalmente enganosa e não se precipite em acusar "culpados".
É para isso que servem as investigações.
Um abraço,
Jeff
Jeff, acho que agora você consegue moderar os comentários novamente, né? Então, tenho a GSR125, sucessora espiritual da Yes, e uma das coisas que me chama a atenção é justamente o desenho da roda. A GSR continua com a roda com 5 raios, mas o ângulo deles em relação ao centro da roda, e consequentemente à direção de deslocamento, é menos agressiva, além do raio ter uma largura constante ao longo da roda e não se estreitar nas pontas, formando aquela estrela ninja da Yes. Desconfio que a roda da GSR é uma revisão da roda original da Yes, pelo menos sempre foi essa a impressão que ela sempre me passou. Ambos os modelos compartilham da maioria das peças e acessórios, mas a GSR trouxe melhoras no motor (com o eixo balanceiro), suspensão traseira a gás (metida a esportiva #sóquenão, mas reamente muito eficiente), e as rodas com esse desenho mais simples, porém ao meu ver, e é o que parece, mais robusto e seguro, além de mais bonito, convenhamos. Abraço!
ResponderExcluirOlá, Péricles!
ExcluirConsigo sim, mas às vezes demoro um pouco porque preciso lembrar de olhar a caixa de comentários onde eles ficam aguardando moderação.
Interessante saber que a suzuki reforçou a roda! Não fariam isso se não tivessem constatado a necessidade, ninguém encarece o projeto (e deixa o design menos arrojado) se não tiver um bom motivo.
Não encontrei nada relacionado a recall ou acidente relacionado a isso no exterior, mas em compensação descobri que as rodas raiadas das bmw 1200 GS estão se desmontando depois de 4 meses de uso lá na Austrália e o assunto estava sendo investigado no final de 2018... vai virar postagem.
Um abraço!
Jeff