quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

O que é descarbonização e flush do motor?

De modo geral, descarbonização é a remoção do carvão que se acumula no motor, portanto o 'flush' também se enquadra nessa categoria, mas não são a mesma coisa conforme explicarei ao longo do texto.

A descarbonização pode ser feita apenas com produtos químicos solventes — sem abrir o motor.

E também por limpeza e lavagem com escova após a remoção e desmontagem do motor durante um reparo de grande monta, como a troca de peças do câmbio ou de serviços no cilindro/pistão

Qual a origem desse carvão?

Carvão é carbono, carvão é o resíduo sólido da queima de materiais orgânicos.

Cumé? Material orgânico dentro do motor?

Sim — como foi dito naquela aula chata de Química em que você estava no facebook com os amigos, toda substância que tem carbono em sua composição é material orgânico.

Gasolina de verdade (não a nossa) é composta exclusivamente por grandes moléculas formadas de carbono + hidrogênio, assim como o óleo lubrificante é feito de moléculas ainda maiores e longas mais aditivos diversos. E é por isso que os lubrificantes são mais densos e viscosos que a gasolina.
Imagem: Wikipedia - Moléculas de gasolina pura (sem álcool) (à esquerda e centro) e um aditivo não usado no Brasil à direita 
Etanol é basicamente C + H em moléculas médias com a inclusão de um átomo de oxigênio em cada uma. 
Imagem: Wikipedia - Molécula de etanol
E celulose idem, mas proporcionalmente com muito mais oxigênio e radicais OH.
Imagem: Wikipedia - Molécula de celulose
Celulose??? Tem madeira dentro do motor???

Yes, tem madeira. Especificamente, cortiça.

Cortiça é a casca de uma árvore, o sobreiro ou corticeira.
Imagens: Pesquisa no google

Os discos de embreagem de motos populares são feitos de cortiça prensada e só aguentam o tranco porque trabalham em banho de óleo.
Imagem: http://www.masada.com.br/disco-de-embreagem-kit-cg125-fan-ml-titan-125-kansas-150-nxr125-bros-scud-p3908/
— Imagem ilustrativa, não conheço nem produto nem fabricante.
Em compensação, patinam todas as vezes que a embreagem é acionada, o que causa calor por atrito.

Calor por tempo prolongado queima a cortiça — embreagens desreguladas queimam e desgastam a cortiça muito rapidamente. Daí a necessidade de manter o cabo da embreagem sempre bem regulado.

Todo material orgânico queimado vira principalmente carvão, gases (nitrogênio, CO e CO2 na forma gasosa e oxigênio e hidrogênio livres ou na forma de chama) e vapor de água.

Sobram outros resíduos de contaminantes como enxofre, fósforo, silício abrasivo, etc. em proporções bem menores.

De onde vem o carvão nos motores?

Há três tipos:

O carvão residual da queima do combustível, o carvão residual da queima do óleo e o carvão residual da queima por atrito dos discos de cortiça da embreagem.

O carvão que não é eliminado pelo escapamento na forma de fuligem acaba se acumulando e formando uma crosta seca sobre a superfície da cabeça do pistão e faces do cabeçote e válvulas da câmara de combustão.
Imagem: Dr. Daniel operando Jezebel

Já o carvão que se deposita sobre a superfície oleada do cilindro se mescla com o óleo e acaba se unindo aos outros dois tipos, todos contaminando o óleo do motor — é por isso que ele fica preto depois de algum tempo de uso.

Lá ele também se junta às partículas de aço, alumínio e bronze resultantes do desgaste normal do motor e essa sopa fica circulando dentro do motor até que as partículas maiores sejam retidas pelo filtro. Ou não. Daí a importância de usar um óleo de viscosidade adequada para minimizar o desgaste do motor.

Essa sopa encorpada de óleo sobre superfícies muito quentes como o interior do cabeçote acaba sendo queimada e forma uma crosta ressecada meio úmida de óleo chamada borra. Daí a importância de não rodar com pouco óleo, ele ajuda a esfriar o cabeçote.

O óleo não totalmente queimado forma uma gosma melequenta que tende a se acumular nos locais de alta temperatura e baixa velocidade de circulação do óleo.

Se a gosma for mais sólida do que melequenta, ela será chamada de laca — geralmente a laca aparece nos dutos de admissão de mistura por evaporação do combustível.
Imagem: Vídeo do Furlani

Quanto mais tempo o óleo permanecer dentro do motor, maior a tendência de ele se decompor e formar borra e gosma. Daí a importância de não obedecer os intervalos de troca absurdos recomendados pelos fabricantes.

Crostas, borras, gosmas e lacas são formas de carbonização do motor, se bem que o termo seja mais utilizado para falar da carbonização seca do interior da câmara de combustão. Falo mais sobre carbonização nesta outra postagem

No vídeo da última postagem você viu que o motor daquela CG 150 tratada em concessionária precisou fazer uma lavagem interna (flush).

Só para comparação, aí vai de novo a foto do motor da Jezebel aos 62 mil km sempre rodando com óleo mineral trocado na hora certa:
Imagem: Foto tirada pelo Daniel quando trocou o câmbio da minha Kansas 150, mais detalhes nesta postagem.

Qual a diferença entre essa lavagem interna e a descarbonização do motor?

Os dois irão retirar o carvão do motor, mas a descarbonização se refere ao carvão acumulado no pistão e câmara de combustão, enquanto a lavagem interna com solvente desengraxante remove o carvão (borra e goma) do cárter, superfície interna do cabeçote e galerias de óleo.

Esse óleo de limpeza com desengraxante precisa ser muito bem removido, então o ideal é não precisar recorrer a esse recurso extremo.

A lavagem interna sempre apresenta o risco de não remover todas as crostas e borras na primeira troca de óleo.

Essas coisas enfraquecidas pela primeira lavagem podem se soltar de repente e circular dentro do motor, vindo a entupir o filtro de óleo, o filtro de tela e principalmente a entrada da bomba de óleo, fazendo o motor se fundir. Daí ser preferível não deixar a borra se formar do que ser obrigado a usar produtos químicos para sua eliminação — mas no caso da moto do vídeo de ontem, não tem outro jeito.  

E o que fazer para que a lavagem interna e a descarbonização não sejam necessárias?

Usar um bom óleo de viscosidade adequada no nível correto (não somente a quantidade insuficiente recomendada) para evitar as borras de óleo.

E usar gasolina aditivada para evitar a carbonização de carburador ou válvula de aceleração e câmara de combustão.

Aí você diz:

Mas o manual diz que não pode usar gasolina aditivada, só normal!!

E eu te digo que isso é balela para você virar freguês de concessionária.

E te digo mais:

A obrigatoriedade de uso de gasolina aditivada em todo o país vem sendo adiada desde 2013 e parece que será a única disponível nas bombas a partir de julho de 2017... 

E aí, comofas, não vai usar mais a moto?

Então é isso.

Trate bem de sua moto, não deixe de fazer as revisões, use bons produtos, não se esqueça de limpar todos os filtros.


Filtro centrífugo da Jezebel fotografado pelo Dr. Daniel
CG e várias dafras usam filtro de óleo do tipo centrífugo que somente podem ser limpos com a abertura da tampa direita do motor... 

Serviço para fazer só em oficina ou tendo um conhecimento razoável de mecânica e ferramentas adequadas.

Tomando esses cuidados básicos e não sendo tapeado, sua moto te proporcionará muita satisfação por longo tempo.

Um abraço,

Jeff

19 comentários:

  1. Mais um post show !!! Já encaminhei para meu mecânico de confiança, e venho percebendo que ele está abrindo os olhos para essas "realidades" do mercado. Bom para mim, para minha motoca, e para outros clientes dele.

    Eu acredito que outro post, mais aprofundado sobre esse assunto de descarbonização e flush, será bem interessante. Posso lhe indicar um canal de vídeos de uma oficina mecânica de automóveis em BH: HighTorque do ADG. Apesar de ser sobre mecânica de automóveis, a teoria e prática de manutenção em motores a combustão, e a maioria dos produtos utilizados para limpeza, servem para motocicletas também.

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    1. Obrigado, Marcelo!
      Vou dar uma conferida!
      Tenho a preocupação de não me aprofundar demais em alguns assuntos para não tornar a leitura mais chata do que já é...
      De qualquer forma, esse é um assunto que não tenho muito mais o que dizer. Não gosto da solução de usar produtos químicos para descarbonização porque dependendo da maneira como for feita, poderá trazer outros problemas. A única vez que descarbonizei o motor da moto foi feita com o motor desmontado e não com o uso de solventes... não sei o que eu poderia acrescentar ao que foi dito na postagem.
      Um abraço,
      Jeff

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  2. No manual da Yamaha é o contrário,recomendam gasolina aditivada de boa qualidade e não comum,menos mal pelo menos nesse ponto né,apesar que nossa gasolina é ruim de qualquer jeito,seria menos pior usar a aditivada.

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    1. Pelo menos nesse aspecto os engenheiros da yamaha fizeram direitinho o dever de casa. Já quanto ao intervalo de troca do óleo... 5.000 km com óleo mineral ninguém merece. O Yamalube / Havoline é muito bom mesmo, mas nenhum óleo mineral aguenta tudo isso não. É muita contaminação, não tem jeito.
      Um abraço,
      Jeff

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    2. E. vou te dizer, sempre usei apenas aditivada, e a queda de rendimento do motor foi notável depois da mudança para 27,5% de álcool. E é certeza que o problema foi na gasolina, porque quem perdeu rendimento não foi a Jezebel de motor cansado, foi a Edith que o motor estava apenas com 8 mil km.
      Eu de novo,
      Jeff

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    3. O ideal seria subir um pouco a taxa de compressão para compensar essa quantidade de álcool, porém precisaria acertar ponto de ignição e afinar a mistura para o motor ficar redondinho.

      Um abraço!

      Dan

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    4. No manual da Suzuki também a recomendação é de sempre usar gasolina aditivada.

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    5. Olá, Dan!
      E o pessoal está "solucionando" o problema de trica de cabeçote da CB / XRE 300 destaxando o danado... pioram uma coisa para piorar ainda mais outra... triste.
      Um abraço,
      Jeff

      Olá, Péricles!
      Recomendar gasolina aditivada em um país como o Brasil onde a gasolina é batizada na refinaria seria obrigação de todo e qualquer fabricante, não tem desculpa para isso.
      Um abraço,
      Jeff

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  3. Sou testemunha viva da importância do uso da gasolina aditivada, tive um fusca, mexi muito nele, a cada ano e meio eu desmontava o carburador devido aos entupimentos com substância gelatinosa amarela. Quando a gasolina aditivada surgiu, passei a usar no fusca, sendo que não tive mais problemas com o carburador. Então, uns dois anos e meio se passaram e fiquei curioso com o carburador, visto que não deu mais problemas, qual não foi minha surpresa quando desmontei o dito cujo e encontrei tudo limpo, sem a geleia amarela. Tem mais benefícios que a gasolina aditivada traz aos motores, mas fica um pouco longo explicar aqui.
    Usem sempre gasolina aditivada em suas motos e sejam felizes.
    Abração.

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    1. Obrigado pelo depoimento, José Carlos!
      Eu não usava gasolina comum nem na primeira moto nos anos 70/80. Me lembro de ter desmontado o carburador uma única vez porque era recomendado fazer isso nas revisões pelo fabricante (que recomendava gasolina comum) e também encontrei tudo limpo. Só mandei limpar o carburador da Jezebel preventivamente umas duas vezes antes de viagens longas como a ida a Foz e a ida a Floripa, mas a chance de ter problemas com os mecânicos era maior do que manter tudo funcionando como estava, parei de fazer isso. Recentemente meus amigos desmontaram o carburador porque ela ficou parada alguns meses, aí sim é caso que justifica.
      Um abraço,
      Jeff

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  4. E esse aditivo redutor de atrito existente em algumas marcas será que funciona mesmo e traz algum benefício ao motor em relação ao desgaste? As vezes acho que é só marketing para poder vender mais.
    E qual marca você usa e recomendada?

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    1. Olá, Vanderson!
      Tem muito marketing, mas funciona sim.
      Só tem que tomar cuidado com o tipo dos aditivos redutores de atrito porque podem ser prejudiciais aos motores das motos.
      A embreagem das motos trabalha em banho de óleo e se você colocar um redutor de atrito tipo bissulfeto de molibdênio como o Molykote o motor irá girar mais livre, mas em compensação a embreagem irá começar a patinar porque ela depende do atrito correto para transmitir a força do motor. Usei Militec e gostei do resultado. Na primeira moto lá se vão 40 anos mal me lembro. Tenho quase certeza que cheguei a usar Bardhal B12 em proporções minúsculas e parece que o resultado foi bom, mas vendi aquela moto em pouco tempo, não pude avaliar a longo prazo.
      Um abraço,
      Jeff

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  5. Olá Jeff, erro meu por não deixar claro a pergunta; O aditivo que me refiro são os que é exixtente na gasolina aditivada Shell e também na gasolina aditivada da Petrobrás, por exemplo, que dizem reduzir atrito nos componentes internos do motor.

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    1. Ah, tá. Quem fala isso é a petrobras, né? A tal gasolina grid. Experimentei uma vez e não notei nada de excepcional conforme propagandeado. Me pareceu mais marketing para enfrentar a shell V-Power que ainda é minha preferida. Por sinal, a V-Power era bem melhor antes do álcool a 27,5%. Brasil, sil, sil.
      Um abraço,
      Jeff

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    2. Jeff, troquei de posto e de gasolina depois de uma má experiência com essa Grid ultramegapowerfodona da Petrobrás. Quando comecei a abastecer nesse posto, a moto começou a engasgar e falhar, coisa que nunca havia acontecido. Troquei de posto e de gasolina (BR Aditivada, sem a marca Grid), e tudo voltou ao normal.
      Penso que pode ser algum problema com o posto, conheci uma pessoa que passou pela mesma experiência por lá...

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    3. Olá, Péricles!
      Pois é, várias redes de postos acabam nas mãos de quadrilhas eleitas ou não. Quando o posto, o próprio combustível e até a eficiência da fiscalização é colocada em dúvida, a coisa vira um Deus nos sacuda.
      Um abraço,
      Jeff

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  6. O leitor Anderson Marcelo Bica comentou no facebook:

    Ótimo post!
    Tenho uma carburada e uso sempre gasolina Comum, como faço pra passar a por aditivada? Posso colocar meio a meio? Ouvi dizer que quando se usa comum e coloca Aditivada pode entopir o carburador, pois a sujeira do tanque solta...
    As vezes o orçamento atrapalha e não da pra abastecer sempre com aditivada...

    Olá, Vanderson!
    Não tenho experiência para falar a respeito, eu nunca passei por isso porque sempre usei 100% aditivada desde o primeiro tanque.
    Acredito que o tanque precisa estar em uma condição bem precária para chegar a causar problema, mas sugiro pesquisar o assunto na internet, sempr aparece o depoimento de alguém que passou pela situação ou que confirmou que não dá problema.
    Se tiver receio, comece misturando meio a meio para não soltar algo que esteja preso no tanque de uma vez e vá aumentando aos poucos.
    Um abraço,
    Jeff

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  7. Ao.Jeff,já ouviu falar do Alfa-X redutor de atrito?
    Funciona igual ao Militec,porém é mais barato,usa-se menos quantidade e vai com qualquer óleo e não afeta a embreagem.
    E também é brasileiro.tem até anúncio nas lojas americanas,veja na net.
    Grande abraço,man!

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    1. Olá, Pedra!
      Acho que você falou uma vez, mas não tive oportunidade de testar. Ainda não posso falar nada a respeito.
      Um abraço,
      Jeff

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